Chico Díaz é homenageado no Fest Aruanda
Por Maria do Rosário Caetano, de João Pessoa (PB)
O ator Chico Díaz terá, ao longo de 2019, ano de seu sexagésimo aniversário, vitrine privilegiada de seu trabalho no cinema e na TV. Primeiro, será visto, na HBO, na pele do futuro Marechal Rondon, coprotagonista de “O Hóspede Americano”, série e filme de Bruno Barreto. Depois, estará nos cinemas com “Montanha Russa”, quarto longa-metragem do carioca Vinícius Reis, e “A Casa do Girassol Vermelho”, do mineiro Eder Santos. Irá, ainda, para Portugal, onde protagonizará “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, filme de João Botelho, recriação de um dos romances mais conhecidos de José Saramago. Ricardo Reis, nunca é demais lembrar, é um dos heterônimos de Fernando Pessoa, glória máxima, junto com Camões, da poesia lusitana. Depois do filme português, Chico Díaz irá ao Paraguai, para atuar em “Yacaá”, longa-metragem de Ramiro Rodriguez.
Francisco Díaz Rocha, que nasceu no México, filho de pai paraguaio, o educador Juan Díaz Bordenave, e da tradutora brasileira Maria Cândida, chegou ao Rio de Janeiro aos dez anos, depois de passar por países hispano-americanos (Peru, inclusive) e pelos EUA. No Brasil, desenvolveu sua intensa e importante trajetória artística. Fez mais de 60 filmes (entre eles “O Sonho Não Acabou”, de Sérgio Rezende, “A Cor do seu Destino”, de Jorge Durán, “Amarelo Manga”, de Claudio Assis, “Sol do Meio-Dia”, de Eliane Caffé, e “Corisco e Dadá”, de Rosemberg Cariry), uma dezena de novelas e minisséries, além de vinte peças. Uma delas, “A Lua Vem da Ásia”, adaptação de livro de Campos de Carvalho, já foi por ele exaustivamente retrabalhada em roteiro cinematográfico. O texto deve transformar-se em longa-metragem, com direção do próprio ator, marcando assim sua estreia como realizador de ficção. Antes, ele concluirá documentário sobre a trajetória do pai, autor de vinte livros, amigo de Paulo Freire e adepto de ideias ligadas à comunicação e à cultura como práticas da liberdade.
Ao receber um Troféu Aruanda (por quase quatro décadas de trabalho artístico) das mãos da atriz Zezita Mattos, sua colega de elenco na novela “Velho Chico”, e do cineasta Rosemberg Cariry (que o dirigiu também em “Lua Cambará” e “Os Pobres Diabos”), Chico Díaz, com lágrimas nos olhos, avisou que anda “chorando muito”, talvez consternado com o estado geral da Nação. E garantiu, amoroso, que poderia, por falsa modéstia, dizer que não merecia o Troféu Aruanda. Mas que diria o contrário, por sentir, com toda sinceridade, que merecia, sim!, já que vem dedicando sua vida inteira ao ofício de ator. Que trabalhou e trabalha incansavelmente no Brasil e no exterior (participou de mais de dez projetos internacionais, como “Ardor”, ao lado de Gael García Bernal, e “Palavras com Deus”, produzido por Guillermo Arriaga).
O ator lembrou que, por seu tipo físico, é muitas vezes reconhecido como nordestino, e que estava feliz em ser homenageado numa edição, a de número 13 do Festival Aruanda, justo esta que serve de vitrine a seis longas-metragens locais, reunidos na mostra Sob o Céu Nordestino, que vieram somar-se à safra nacional. E arrematou: “Tenho batalhado muito para manter uma linha coerente na relação de significância do meu ofício junto à população brasileira. Respeito muito este meu ofício e percorri cada milímetro da minha carreira com visão atenta e espantada da realidade. Dou muita importância a este ofício de alta significação, pois lida com o encantado, com simbologias profundas. Respeito muito este meu ofício, para o qual fui escolhido”.
O cearense Rosemberg Cariry, ao entregar o troféu ao amigo mexicano-brasileiro, ponderou: “este prêmio simboliza o reconhecimento do cinema nordestino, que resiste, é insubmisso e ousa pensar de forma mais ousada este país”.
O primeiro dos novos trabalhos de Chico Díaz a chegar ao público será “O Hóspede Americano”. No começo de 2019, a HBO exibirá, em quatro capítulos, a série que reconstitui a visita do ex-presidente dos EUA, Theodore Rooselvet (1858-1919), o Teddy, ao Brasil, no começo do século XX. Ele teve como anfitrião e guia o futuro Marechal Rondon (1865-1958). Na época da expedição à Amazônia (nos anos de 1913 e 1914), o matogrossense Rondon, defensor das populações indígenas (seu lema: “morrer se preciso for, matar nunca!”), tinha 48 anos e conhecimento significativo de nossos interiores e florestas. Teddy queria conhecer nossa fauna, flora e outras riquezas naturais. Caçar também. A dupla, com seus ajudantes, chegou a identificar um “rio desconhecido”, batizado poeticamente de Rio da Dúvida.
Falada integralmente em inglês, a série e o filme “O Hóspede Americano” têm Aidan Quinn na pele do 25º presidente dos EUA (quando veio ao Brasil, Teddy já concluíra seu mandato). No elenco, além do coprotagonista Chico Díaz, há outros atores norte-americanos e brasileiros (entre estes, Claudio Jaborandi, Teodoro Cochrane e João Cortez). Cabe a este jovem de cabelos vermelhos interpretar o Major Thomaz Reis, o cinegrafista de Rondon.
“Montanha Russa”, fruto da segunda parceria de Vinícius Reis com Chico Díaz (a primeira se deu em “Praça Saenz Peña”, de 2008), tem como pano de fundo o Brasil da era de privatizações do Governo FHC (década de 1990). No elenco, além de Chico Díaz, estão Sílvia Buarque (mulher do ator, na vida real) e Bianca Byington.
“A Casa do Girassol Vermelho”, novo filme do artista plástico e videomaker Eder Santos, foi rodado integralmente numa velha fábrica abandonada em Minas Gerais. O longa-metragem recria dois contos do escritor Murilo Rubião e tem Chico Díaz como protagonista absoluto. Ele contracena com Luísa Lemmertz, neta da atriz Lilian e filha de Júlia Lemmertz. A equipe, brasileira e internacional, tem fotógrafo alemão e montador romeno.
Três detalhes finais: 1. Chico Díaz aparecerá, também, no elenco de “Cine Holliúde 2 – A Chibata Sideral”, de Halder Gomes, na pele de Véi Góis (Véi, pois assim se expressam os personagens cearenses das comédias halderianas). 2. Aparecerá, ainda, em série original inspirada em “Cine Holliúde”, do mesmo Halder, que será exibida em breve pela Rede Globo. 3. O ator, que brilhou na pele de um erotizado açougueiro, par da futura Kika “Canibal”, em “Amarelo Manga”, não rompeu em definitivo com Claudio Assis, o temperamental cineasta pernambucano. Embora não tenham mais trabalhado juntos — por divergências quanto ao método de trabalho (Chico não aceita alguns dos procedimentos digamos “pouco ortodoxos” de Assis) —, o mexicano-brasileiro segue fã dos filmes do brigão realizador de Caruaru. “Vejo todos os filmes dele, ele é muito talentoso”. Quem sabe aparam as arestas e voltam a trabalhar juntos, no mesmo “set” cinematográfico?!