Academia de Hollywood anuncia ‘short list’ e “Marte Um” tem chance de figurar entre os 15 estrangeiros

Por Maria do Rosário Caetano

Nessa quarta-feira, 21 de dezembro, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood anunciará os semifinalistas (sua ‘short list’, com 15 títulos cada) em algumas categorias de sua premiação anual, a de número 95, cuja cerimônia festiva acontecerá no dia 10 de março do próximo ano.

Duas categorias se destacam – melhor longa documental e melhor filme internacional. Na primeira, o Brasil participa com “Quando Falta o Ar”, das irmãs Ana e Helena Petta. O documentário, que aborda a epidemia de Covid e o trabalho do SUS, venceu o Festival É Tudo Verdade, mas não aparece nas listas de favoritos.

Já no campo da ficção, o Brasil pode figurar na ‘short list’ com “Marte Um”, do mineiro Gabriel Martins, ficção indicada pela Academia Brasileira para disputar a estatueta de melhor produção internacional. Ele marca presença em diversas listas ampliadas de favoritos. Se, na etapa seguinte – a dos finalistas, que será divulgada em 24 de janeiro –, “Marte Um” conseguirá uma das cinco cobiçadas vagas, não se pode prever. Nessa derradeira etapa ele não aparece entre os mais cotados. Mas este ano a categoria internacional não conta com favoritos arrasadores como “Roma”, “Parasita” ou “Driving my Car”.

Os cinco títulos indicados, pela Imprensa Internacional atuante em Hollywood, para disputar o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro não incluem o longa brasileiro. Mas a lista da Associação Estrangeira deve coincidir com a do Oscar em pelo menos três títulos – o alemão “Nada de Novo no Front”, de Edward Berger, que tem o astro Daniel Brühl como coprodutor e ator; o argentino “Argentina 1985”, de Sebastian Mitre, e o coreano do sul “Decisão de Partir”, de Park Chan-wood. A quarta aposta do Globo de Ouro – “Close”, do belga Lukas Dhont – também tem chances de entrar na short list e até figurar entre os cinco finalistas à estatueta nonagenária.

Já o indiano “RRR – Revolta, Rebelião, Revolução”, de S.S. Rajamouli, não poderá figurar na lista do Oscar internacional, pois o país de Satyajit Ray preferiu indicar “Last Film Show”, de Pan Nalin, para a vaga. Quem sabe os votantes do Oscar (que já beiram os 10 mil) incluem o badaladíssimo “RRR”, disponível na Netflix, em outras categorias que não dependam do aval prévio de Academias nacionais. O filme tem um dos roteiros mais delirantes e inventivos dos últimos tempos, figurinos, direção de arte e acrobacias dançadas-cantadas de outro mundo, direção inacreditável, etc., etc. Poderia figurar até entre os nove finalistas na categoria principal (melhor filme), como outrora aconteceu com “O Artista”, de Michel Hazanivicius, “Roma”, de Alfonso Cuarón, e “Parasita”, de Bong Joon-ho.

No Globo de Ouro, o sueco “Triângulo da Tristeza”, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, conseguiu vaga na categoria “comédia-musical”. Em outra categoria importante – melhor animação –, um título furou o cerco anglo-saxão: o japonês “Inu-Oh”, de Masaaki Yuasa.

A lista de pré-indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro deste ano contém 92 produções. Uma a menos que no ano passado. Digna de nota a ausência da Rússia, cinematografia poderosa e com mais de dez indicações e quatro vitórias: em 1968, com “Guerra e Paz”, de Sergei Bondarchuk; em 1975, com “Dersu Uzala”, de Akira Kurosawa (produção soviética filmada em solo russo); em 1980, com “Moscou Não Acredita em Lágrimas”, de Vladmir Menshov, e, em 1995, com “Sol Enganador”, de Nikita Mikhalkov. Por causa do boicote ocidental à guerra na Ucrânia, os russos não são, atualmente, bem-vindos em terras hollywoodianas. Outra ausência: Cuba, uma cinematografia que já teve força, mas anda em transe agravado pela pandemia, quando a maior fonte de divisas do país – o turismo – colapsou.

A América Latina marca presença das mais significativas entre os 92 títulos inscritos. E, além do Darín movie “Argentina 1985”, pode figurar na ‘short list’ com o brasileiro “Marte Um” e o chileno “Blanquita”, de Fernando Guzzoni, que ganhou destaque na mostra Horizonte, no Festival de Veneza.

Sem esquecer o México, que arrasou na última década com o quarteto Cuarón-Del Toro-Iñarritu-Lubeski. O país de Frida Kahlo chega forte ao Oscar internacional. “Bardo – Falsa Crônica de Algumas Verdades” (foto), de Alejandro González Iñárritu, marco do retorno do diretor de “Amores Perros”, “Birdman” e “O Regresso”, dono de penca de estatuetas, ao solo azteca, participa de listas de favoritíssimos, embora tenha sido esnobado pelo Globo de Ouro.

Como o colega Alfonso Cuarón, em seu amarcord ambientado no bairro de “Roma”, na capital mexicana, Iñarritu resolveu dar uma de filho pródigo. E enfrentar as complexas relações entre os EUA e o vizinho postado abaixo do Rio Grande. Tema dos mais incandescentes e que pode render a ele indicação a filme estrangeiro e até, quem sabe, vaga entre as nove produções da categoria principal. Afinal, Iñárritu tem green card e filhos chicanos.

Os plugados no cinema de fala espanhola verão que o venezuelano Lorenzo Vigas, premiado com o Leão de Ouro, em Veneza, pelo ousado “De Longe te Observo” (2016), comparece com sua nova realização, “A Caixa”. Mas o filme não causou a mesma sensação que o consagrado em terras venezianas.

O franco-argelino Rachid Bouchereb, do poderoso “Indigènes”, deixa a França para, com “Nossos Irmãos” (“Nos Frangins”), representar o país da África árabe. E a França manda ver com o forte “Saint Omer”, de Alice Diop, realizadora com origens fincadas na mesma África. O cinema feminino tem, este ano, uma candidata de peso: a catalã Carla Simón, que representa a Espanha com o fascinante “Alcarràs”, Urso de Ouro em Berlim.

O Leste europeu está, como sempre, muito bem representado. A Ásia também. O Japão, que venceu em março deste ano com o belíssimo “Drive my Car”, tem chances mínimas com “Plano 75”, de Chie Hayakawa, triste demais e pouco mobilizador (embora trate de tema enternecedor – os rejeitados pela velhice no mundo contemporâneo).

Quem percorrer a lista dos 92 indicados por Academias nacionais verá que países anglo-saxões como o Reino Unido, a Irlanda, a Austrália e o Canadá (a parte francofônica sempre pôde concorrer a melhor filme internacional) estão cavando espaço na restrita categoria do Oscar dedicada ao cinema planetário. E podem fazê-lo desde que suas produções sejam faladas em língua estrangeira. Grandes produtores, eles podem apostar na diversificação.

Os interessados verão no listão de candidatos também títulos realizados por nomes caros à cinefilia. Caso de “EO”, do polonês Jerzy Skolimovski, de 84 anos, uma fábula que se propõe a mostrar a Europa contemporânea pelos olhos de um burro cinza. Um burro que evoca longa bressoniano – “A Grande Testemunha” (“Au Hazard Bathazar”), de 1966. E no elenco figura a musa-cabeça da Cahiers du Cinéma, Isabelle Huppert.

Dois países escandinavos, a Dinamarca (com “Holy Spider”, de Ali Abbasi) e a Suécia (com “Boy From Heaven”, de Tarik Saleh) apostam em produções assinadas por cineastas originários do Oriente Médio. Ou seja, imigrantes ou filhos de imigrantes que lá encontraram guarida. O país de Ingmar Bergman deixou de lado seu realizador mais badalado (e controvertido), o duas vezes premiado com a Palma de Ouro em Cannes, Rubem Östlund (e seu “Triângulo da Tristeza”). A razão será técnica?

Afinal, o vencedor de Cannes, que tem um transatlântico recheado de milionários turistas como principal cenário, utiliza o esperanto do mundo contemporâneo – a língua inglesa – como veículo de expressão da maior parte de sua narrativa.

A Itália, um dos países que mais Oscar estrangeiro ganharam (graças à Fellini, De Sica e outros mestres) tem este ano um candidato apagado: “Nostalgia”, de Mario Martone, diretor importante, mas meio sumido desde a ascensão da geração liderada por Paulo “Il Divo” Sorrentino e Matteo “Gomorra” Garrone. Mas no elenco brilha o astro peninsular da hora – Pierfranceso Favino.

Confira as produções pré-indicadas a disputar vaga ao Oscar de melhor filme internacional:

Os mais cotados

. “Bardo – Falsa Crônica de Algumas Verdades”, de Alejandro González Iñárritu (México)
. “Argentina 1985”, de Santiago Mitre (Argentina)
. “Nada de Novo no Front”, de Edward Berger (Alemanha)
. “Decisão de Partir”, de Park Chan-wook (Coréia do Sul)
. “Holy Spider”, de Ali Abbasi (Dinamarca
. “Close”, de Lukas Dont (Bélgica)
. “Saint Omer”, de Alice Diop (França)
. “Alcarrás”, de Carla Simon (Espanha)
. “Boy From Heaven”, de Tarik Saleh (Suécia)
. “Marte Um”, de Gabriel Martins (Brasil)
. “Belas Criaturas”, Guðmundur Arnar Guðmundsson (Islândia)

Outros concorrentes

. “Last Film Show”, de Pan Nalin (Índia)
. “EO”, de Jerzy Skolimovski (Polônia)
. “Nice View”, de Shawkat Amim Korki (China)
. “Nossos Irmãos” (“Nos Frangins”), de Rachid Bouchareb (Argélia)
. “Nostalgia”, de Mario Martone (Itália)
. “Plano 75”, de Chie Hayakawa (Japão)
. “Terceira Guerra Mundial, de Houman Seyyedi (Irã)
. “Joyland”, de Saim Sadiq (Paquistão)
. “Eami”, de Paz Encina (Paraguai)
. “A Caixa”, de Lorenzo Vigas (Venezuela)
. “Los Reys del Mundo”, de Laura Mora Ortela (Colômbia)
. “Blanquita”, de Fernando Guzzoni (Chile)
. “Lo Invisible”, de Javier Andrade (Equador)
. “O Empregado e o Patrão”, de Manoelo Nieto (Uruguai)
. “Domingo e a Neblina”, de Ariel Escalante (Costa Rica)
. “Birthday Boy”, de Arturo Montenegro (Panamá)
. “Utama, Terra Esquecida”, de Alejandro Grizi (Bolívia)
. “Bantu Mama”, de Ivan Herrera (República Dominicana)
. “Coração da Lua”, de Aldo Savini (Peru)
. “O Silêncio do Infiltrado”, de Anais Taracena (Guatemala)
. “You Won’t Be Alone”, de Goran Stolevski (Austrália)
. “Klondike – A Guerra na Ucrânia”, de Maryana Er Gorbach (Ucrânia)
. “Peregrinos”, de Laurynas Bareiša (Lituânia)
. “Il Boemo”, de Petr Václav (República Tcheca)
. “Narcosis”, de Martijn de Jong (Holanda)
. “Farha”, de Darin S. Sallam (Jordânia)
. “A Menina Silenciosa”, de Colm Bairead (Irlanda)
. “Memory Box”, de Joana Hadjithomas e Kalil Joreige (Líbano)
. “Ajooma”, de Shuming He (Singapura)
. “One for the Road”, Baz Poonpipura (Tailândia)
. “Goddamed Asura”, de Yian Lou (Taiwan)
. “Corsage”, de Marie Kreutzer (Áustria)
. “Febre do Mediterrâneo”, de Maha Haj (Palestina)
. “Aurora’s Sunrise”, de Inna Sahakyan (Armênia)
. “Victim”, de Michael Basko (Eslováquia)
. “Orchestra”, de Matevz Luzar (Eslovênia)
. “Kalev”, de Ove Musting (Estônia)
. “Raven Song”, de Mohamad al Salman (Arábia Saudita)
. “A Cup of Coffe and New Shoes On”, de Gentian Koçi (Albânia)
. “Magnnetic Fields”, de Yorgos Gousis (Grécia)
. “O Homem Mais Feliz do Mundo”, de Teona Strugar Mitevska (Macedônia do Norte)
. “The Quiet Girl”, de Colm Bairéad (Irlanda)
. “Blockade”, de Adám Tóser (Hungria)
. “Imaculada”, de George Chiper-Lillemrak e Monica Stan (Romênia)
. “Kerr”, de Tayfun Pirselimoglu (Turquia)
. “Alma Viva”, de Cristele Alves Meira (Portugal)
. “578: Shot of the Madman”, de Luong Dinh Dung (Vietnã)
. “The Exam”, de Shawkat Amim Korki (Iraque)
. “Cinema Sabaya”, de Orit Fouks Rotem (Israel)
. “Retourn to Seul”, de David Chou (Cambodja)
. “Carmen”, de Valerie Buhaziar (Malta)
. “January”, de Viestur Kairiss (Letônia)
. “Icarus”, de Carlos Vodele (Luxemburgo)
. “A Long Break”, de Davit Pirsthava (Geórgia)
. “Safe Place”, de Juraj Lerotic (Croácia)
. “On the Job 2: The Missing 8”, de Erik Matti (Filipinas)
. “Procurando por Venera”, de Norika Sefa (Kosovo)
. “Eternal Spring”, de Jason Lotfus (Canadá)
. “Life”, de Emir Baigazin (Cazaquistão)
. “Creators”, de Shamil Alyev (Azerbaijão)
. “Hawa”, de Mejbaur R. Sumon (Bangladesh)
. “Balada”, de Aída Begic (Bósnia e Herzegovina)
. “In The Heart of the Machine”, de Martin Makariev (Bulgária)
. “Tug of War”, de Amil Shivji (Tanzânia)
. “Terastorm”, de Andrew Kaggia (Quênia)
. “The Blue Caftan”, de Maram Touzani (Marrocos)
. “Plantation”, de Dingha Young Eystein (Camarões)
. “Xalé”, de Moussa Sene Absa (Senegal)
. “Under the Fig Trees”, de Erige Sehiri (Tunísia)
. “Tembele”, de Morris Mugisha (Uganda)
. “Carbon”, de Ian Bors (Moldávia)
. “Harvest Moon”, de Amarasaik Bajinnyam (Mongólia)
. “Butterfly on the Windowpane”, de Sujit Bidari (Nepal)
. “War Saylor”, de Gunnar Vikene (Noruega)
. “Muru”, de Tearepa Kahi (Nova Zeilândia)
. “Where the Wind Blows”, de Philip Young (Hong Kong)
. “Home for Sale”, de Taalaibek Kulmendeev (Quirguistão)
. “Winners”, de Hassan Nazer (Reino Unido)
. “Girl Picture”, de Ali Haapsalo (Finlândia)
. “A Piece of Sky”, de Michael Koch (Suíça)
. “Ngeri-Ngeri Sedap”, de Bene Dion (Indonésia)
. “Mrak”, de Dusan Millic (Sérvia)

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