Comando da CineOP quer mostrar filme sobre futebol feminino a Lula e incentivar animação mineira

Foto: Curta de animação “Plantae”, de Guilherme Gehr

Por Maria do Rosário Caetano, de Ouro Preto

Ao encerrar a intensa programação da décima-nona edição da CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, Raquel Hallak, coordenadora geral do evento, já somava energias para desempenhar duas novas missões.

A primeira consiste em programar, no Cineminha do Palácio da Alvorada, o filme “As Primeiras”, de Adriana Yañez, vencedor do Júri Popular, na Mostra de Tiradentes, cidade próxima a Ouro Preto. Trata-se de longa documental sobre as primeiras jogadoras de futebol do país. Na plateia, Raquel espera contar com a presença do corintiano Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República, da primeira-dama Janja, de ministros de estado e representantes do Legislativo e do Judiciário.

A coordenadora da CineOP entende que a exibição de “As Primeiras” servirá para apresentar ao presidente e a seus convidados “um outro tipo de cinema”. Ou seja, aquele produzido por jovens realizadores e com baixíssimos orçamentos.

Este ano, a CineOP contou com a presença da ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Ela discursou para o mais lotado dos auditórios do festival mineiro e mostrou-se sensível às pautas culturais e cinematográficas do país.

Mineira de Montes Claros, a ministra destacou que, “apesar de vivermos num Estado em que as pessoas podem se deslocar para assistir a um filme ou a uma peça de teatro, ainda existem profundas desigualdades sociais no acesso cultural”. Por isso, reafirmou “a necessidade de políticas públicas que garantam a todos os cidadãos o direito aos bens culturais”.

Raquel Hallak garante que os três festivais organizados por sua produtora, a Universo, continuarão buscando interlocutores no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. “Não queremos ficar conversando só entre nós, queremos, isto sim, dialogar com os Três Poderes”.

A segunda missão de Hallak tem tudo a ver com a Mostra de Ouro Preto que acaba de encerrar sua intensa programação e que fez do cinema de animação seu tema principal. Durante seis dias, o festival, realizado na primeira capital de Minas Gerais, exibiu dezenas de curtas e longas-metragens vindos de diversos estados brasileiros. E debateu os desafios enfrentados pelos profissionais do setor, que desde 1917 tentam consolidar uma indústria de filmes animados no Brasil.

Frente ao quadro desenhado pelos encontros de animadores, Raquel voltou sua atenção para Minas Gerais, estado onde ela e sua equipe organizam, além da CineOP e da Mostra Tiradentes, a CineBH, esta dedicada ao audiovisual latino-americano.

Ao preparar a décima-nona edição da CineOP, a equipe de Raquel Hallak pesquisou a história do cinema de animação no Brasil e, em especial, em MG. Rico e instigante material está registrado no catálogo de 510 páginas, lançado no primeiro dia do evento. Os números mineiros impressionaram a coordenadora da CineOP: “já foram realizados, em nosso estado, 580 curtas, um número significativo. Mas, no campo do longa-metragem, o número reduz-se a dois títulos, sendo ambos muito recentes”.

Carmen Lúcia e Raquel Hallak, na CineOP © Leo Fontes/Universo Produção

Um dos filmes, o primeiro longa de animação da história do audiovisual mineiro — “Chef Jack – O Cozinheiro Aventureiro”, de Guilherme Fiuza Zenha — foi lançado ano passado no circuito exibidor. A produção, que contou com retaguarda artística da Escola de Belas Artes da UFMG, vendeu quase 50 mil ingressos. Mas Fiúza morreu, prematuramente, em maio último. Tinha 56 anos. Em tributo à sua memória, a CineOP exibiu “Chef Jack” para auditório lotado.

O segundo longa animado mineiro chama-se “Placa-Mãe”, dirigido por Igor Bastos e premiado no Festival de Havana, ano passado. O terceiro, “Nimuendajú”, tem lançamento previsto para 2025 e traz na direção a cineasta e artista plástica Tânia Anaya, formada pela mesma Escola de Belas Artes. Raquel Hallak acredita que autoridades culturais do estado se conscientizarão, frente ao tardio e reduzidíssimo número de longas animados aqui produzidos, que tais números não condizem com a grandeza artística da terra de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

Em setembro, Belo Horizonte sediará nova edição da CineBH, festival que, desde o ano passado, passou a contar com mostra competitiva de filmes latino-americanos. Tiradentes já conta com mostra competitiva desde sua décima-primeira edição (já foram realizadas 27). A Mostra Aurora destina-se à valorização de filmes de jovens diretores e de baixo orçamento. A CineOP, que ano que vem, em junho, realizará sua vigésima edição, não tem planos de tornar-se competitiva.

Raquel Hallak promete que “a vigésima edição da CineOP será muito especial” e que “um livro relembrará sua história”. Ao invés de colocar filmes em competição, a mostra ouro-pretana poderá investir em prêmios de incentivo à produção e, principalmente, à restauração de títulos importantes de nossa história cinematográfica. Afinal, “sabemos que muitos filmes encontram-se em situação alarmante”. E que “um prêmio para sua preservação será muito bem-vindo”.

A coordenadora da CineOP não esconde um de seus maiores desejos: realizar a vigésima edição da CineOP no Cine Vila Rica. Afinal, trata-se de espaço com larga história, um patrimônio de Minas Gerais e do Brasil. Mas, realista, sabe que só esforço extraordinário permitiria que o Vila Rica se somasse ao Cine Praça (ao ar livre) e ao auditório do Centro de Convenções da UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto). Como na Praça só podem ser exibidas produções censura livre, mais um espaço fechado seria de imensa valia.

“Conseguimos reverter os cortes de recursos destinados ao restauro do Cine Vila Rica”, lembra Raquel. Só que “os serviços de restauro podem consumir até três anos, devido à complexidade dos reparos, em especial das instalações elétricas”. Há que se lembrar que Ouro Preto foi tombada como Patrimônio Histórico da Humanidade. Um incêndio em seu cinema centenário constituiria fato gravíssimo.

O Cine Praça, com plateia de 500 lugares ao ar livre, e o Cine Teatro do Centro de Convenções (plateia de 510 lugares) têm desempenhado bem o seu papel. O cinema, montado anualmente aos pés da estátua de Tiradentes, tendo o Museu da Inconfidência ao fundo, é coberto de elogios pelos cineastas, por oferecer ótima acústica e tela de imensas dimensões. O auditório da UFOP desempenha a contento sua função de sala de exibição, mas não tem o charme do Cine Vila Rica.

Na noite de encerramento da décima-nona edição da CineOP foram exibidos quatro curtas de animação – o carioca “Meow”, de Marcos Magalhães, o paulistano “Guida”, de Rosana Urbes, o goiano “Faroeste: Um Autêntico Western”, de Wesley Rodrigues, e o catarinense “Plantae”, de Guilherme Gehr.

O Cine Praça estava lotado e o público pôde apreciar o trabalho dos franceses Jérôme Lopez e Xavier Garcia, dedicados à música eletrônica. Os artistas criaram nova trilha sonora para os quatro filmes, apresentada ao vivo. E o público soube que futuras colaborações serão ampliadas, ano que vem, entre o festival ouro-pretano e a França. É que os governos Macron e Lula acertaram entendimentos para que 2025 seja o Ano da França no Brasil e vice-versa (o Ano do Brasil na França).

O comando da Mostra  de Ouro Preto comemorou o ótimo público atingido por suas oito mostras (Contemporânea, Homenagem, Preservação, Histórica, Educação, Mostrinha, Cine Escola, Contemporânea). Foram contabilizadas 18 mil pessoas, entre espectadores dos filmes, de shows musicais (realizados no Galpão da UFOP) e de Festa Junina, com fogueira e comidas típicas, que atraiu moradores de todo o município.

Os debates da CineOP, gravados e exibidos pela TV UFOP, permanecem disponíveis nas plataformas digitais da própria CineOP. O Instituto Cultural Itaú Play também promoveu sessões on-line com parte da programação do festival. Os dados foram animadores: houve mais de 100 mil acessos oriundos do Brasil e de mais 63 países.

O clima de fraternidade marcou os debates e as sessões dos filmes programados pela Mostra de Ouro Preto. Dois realizadores — Fernando Koster, de “Amassa que Elas Gostam”, e Arnaldo Galvão, de “Almas em Chamas” — temiam que seus filmes fossem incompreendidos. Lançados em 1998 e  2000, respectivamente, os dois destinam-se a públicos adultos e trazem acentuada carga erótica. E presença feminina em papéis hoje questionados.

Ao apresentar seus filmes no Cine Teatro da UFOP, os dois realizadores lembraram que eles haviam sido feitos em outro contexto histórico. O público, sem assumir postura anacrônica, recebeu a ambos com aplausos. Nenhuma vaia se fez ouvir.

3 thoughts on “Comando da CineOP quer mostrar filme sobre futebol feminino a Lula e incentivar animação mineira

  • 25 de junho de 2024 em 15:25
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    Há um erro na matéria. Onde diz “O segundo longa animado mineiro chama-se ´Nimuendajú´” deveria estar escrito “O terceiro”. O segundo filme de animação em longa metragem de Minas se chama “Placa Mãe” da produtora Espacial Filmes, de Igor Bastos.

    Att. Rafael Guimarães
    Diretor de Fomento em Animação do SINDAV

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    • 25 de junho de 2024 em 19:02
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      Corrigido. Gratos pela mensagem.

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  • 26 de junho de 2024 em 10:13
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    Excelente relato, com promissoras perspectivas para o vigésimo CineOP ano que vem. E que além de uma desejada reabertura do fundamental Cine Vila Rica, também traga o concreto início do Curso de Cinema e Audiovisual da UFOP. Seria o máximo, nesse vigésimo aniversário, marcar a abertura desse novo Curso de Cinema exatamente na cidade que hospeda a CineOP e que possui uma importante e histórica universidade federal.

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