“Ainda Estou Aqui” é finalista a melhor filme internacional no Bafta e “Conclave”, o recordista de indicações
Foto: “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles © Alile Dara Onawale
Por Maria do Rosário Caetano
“Ainda Estou Aqui”, do brasileiro Walter Salles Jr, é um dos finalistas aos prêmios anuais do Instituto Britânico de Cinema, o BFI, responsável pelo Bafta, o “Oscar inglês”.
Fernanda Torres não figura na lista de melhor atriz. Nem ela, nem Nicole Kidman (“Babygirl”), nem Angelina Jolie (Callas”), nem Tilda Swinton (“O Quarto ao Lado”). A parada, para a brasileira, detentora do Globo de Ouro, era intransponível. Sem dúvida, a mais difícil de todas que ela já enfrentou e vai enfrentar. Missão (quase) impossível na terra de Judie Dench, Maggie Smith e Vanessa Redgrave. É de todos sabido que o Reino Unido orgulha-se de ser “a pátria das maiores atrizes do mundo”, herdeiras legítimas de Shakespeare.
Basta examinar os seis nomes indicados – entre eles, as norte-americanas Cynthia “Wicked” Erivo, Mikey “Anora” Madison, Demi “A Substância” Moore e a espanhola Karla Sofía Gascón (“Emilia Pérez”) — para nos depararmos com duas presenças britânicas. A da irlandesa Saoirse Ronan (“The Outrun”) e a da inglesa Marianne Jean-Baptiste (“Hard Truths”). Sobre esta última, a coprotagonista do filme de Mike Leigh, há que se lembrar que ela causou sensação, aos 29 anos, no inesquecível “Segredos e Mentiras” (1996). Afro-britânica, coube a Marianne interpretar oftalmologista renomada, que se descobriria filha biológica de operária branca, a personagem de Brenda Blethyn. Sequência entre mãe e filha, em difícil diálogo, num bar, tornou-se recorrente em antologias de momentos inesquecíveis da história do cinema. Pois agora, aos 57 anos, a atriz está de volta aos holofotes.
O filme de Mike Leigh, de 81 anos, não entrou na principal categoria dos finalistas ao Bafta. Nesta figuram “Conclave”, com 12 indicações, “Emilia Pérez” (com 11), O Brutalista (9), Anora (7) e “Um Completo Desconhecido” (6). Mas “Hard Truths” é um dos dez finalistas ao Bafta de melhor filme britânico. Disputará a estatueta com “Bird”, “Kneecap – Música e Liberdade” (também indicado a melhor filme internacional), “Gladiador 2”, “Blitz”, “The Outrum”, “Love Lies Bleeding: O Amor Sangra”, “Lee”, “Wallace & Gromit: Avengança” e o poderoso “Conclave”.
O musical “Wicked” não figura na principal categoria do Bafta, mas somou sete indicações, uma a mais que “Um Completo Desconhecido”, no qual Timothée Chalamet interpreta o jovem Bob Dylan. A acachapante presença de “Conclave” na lista tem sua razão de ser. Trata-se de filme dirigido pelo alemão Edward Berger, de “Nada de Novo no Front” (2022), que conquistou vários Oscar. Por trás dele estão produtores britânicos e parceiros europeus, unidos para bancar filmes de qualidade (sinônimo nesse caso de “oscarizáveis”). Portanto, de olho nas láureas da Academia. “Conclave” tem elenco internacional, mas é protagonizado pelo astro britânico Ralph Fiennes.
O segundo filme com mais indicações – o francês “Emilia Pérez” – está sob fogo cerrado. Depois de ser premiado em Cannes (elenco coletivo de atrizes e Prêmio do Júri), a fábula musical de Jacques “O Profeta” Audiard brilhou no Globo de Ouro (quatro trofeús conquistados) e ocupou centenas de listas como favorito a figurar, inclusive, entre os dez candidatos a melhor filme do Oscar (e entre os cinco da categoria internacional). Tanto que emplacou as duas categorias no Bafta. Mas a “corrente do contra” vem ganhando ressonância e adesões. Cineasta e críticos mexicanos acusam “Emilia Pérez” de “racista e eurocentrista”. Artigo de Paul Preciado, no El País madrilenho, também detonou o longa francês ambientado no México.
A lista de candidatos a melhor filme internacional do Bafta deverá ser (quase) a mesma da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Nela estão três títulos tidos como franco favoritos – “Emilia Pérez” (França), “A Semente do Fruto Sagrado” (sob bandeira alemã), “Ainda Estou Aqui” (Brasil) e o irlandês (falado em gaélico) “Kneecap – Música e Liberdade”. Só o quinto título, o indiano “Tudo que Imaginamos Como Luz” estará, por regulamento, fora da parada hollywoodiana. Afinal, o grande país asiático indicou oficialmente “Laapataa Ladies”, que nem entrou na lista de 15 pré-finalistas.
As chances de “Kneecap” são imensas, pois o filme vem cativando muitos defensores com sua história alucinada de trio de hip hop, defensor da sobrevivência do idioma gaélico (falado por 40% dos irlandeses, já que a maioria utiliza a língua do colonizador, a Inglaterra). E não se deve esquecer que o Reino Unido vai fechar, quase em peso, com o candidato daquele mundo insular localizado ao norte da Europa. E mais: a presença de profissionais de origem irlandesa na Academia de Hollywood sempre foi muito significativa.
A quinta vaga deve ficar com o italiano “Vermiglio”, um belo drama histórico, o norueguês “A Garota da Agulha” ou com “Flow”, animação da Letônia.
Na categoria melhor longa documental, destaca-se “No Other Land”, produção que uniu esforços de realizadores da Palestina e de Israel. Deve ganhar o Bafta (e o Oscar), pois tudo que o mundo progressista deseja, hoje, é ver a guerra que Israel move contra os palestinos acabar de vez. E um filme que une realizadores dos dois países (embora a Palestina nem seja reconhecida juridicamente como um Estado) configura-se como uma espécie de “utopia realizada”.
Os EUA dominam a lista de indicados com os documentários “Daughters” (sobre meninas negras em visita a pais encarcerados em prisões federais), “Will & Harper”, divertido road movie que acompanha, EUA adentro, a dupla Will Ferrell e sua amiga (e roteirista) Harper, ex-Andrew Steele (ela fez sua transição), e “Super/Homem: A História de Christopher Reeve”, sobre o grave acidente que abreviou a carreira do ator estadunidense.
Ficaram de fora grandes documentários como o senegalês “Dahomey”, vencedor do Festival de Berlim, e “Trilha Sonora para um Golpe de Estado”, da Bélgica (este crítico demais à política intervencionista dos EUA, Reino Unido e Bélgica, na África).
No terreno da animação, o Bafta esnobou duas jóias – o australiano “Memórias de um Caracol”, de Adam Elliot, e “Camponeses”, dirigido pela polonesa Dorota Kubiela e o britânico Hugh Welchman (a partir de romance de vencedor do Nobel, o polonês Wladyslaw Reymont).
Confira os finalistas ao Bafta:
MELHOR FILME
- Conclave, de Edward Berger
- Emilia Pérez, de Jacques Audiard
- Anora, de Sean Baker
- O Brutalista, de Brady Corbet
- Um Completo Desconhecido, de James Mangold
MELHOR FILME BRITÂNICO
- Bird, de Andrea Arnold
- Blitz, de Steve McQueen
- Conclave, de Edward Berger
- Gladiator 2, de Ridley Scott
- Hard Truths, de Mike Leigh
- Kneecap – Música e Liberdade, de Rich Peppiatt (Irlanda)
- Lee, de Ellen Kuras (Irlanda)
- The Outrun, de Nora Fingscheidt
- Wallace & Gromit: Avengança, de Nick Park e Merlin Crossingham
- Love Lies Bleeding: O Amor Sangra, de Rose Glass
MELHOR FILME ESTRANGEIRO
- Ainda Estou Aqui, de Walter Salles (Brasil)
- Tudo que Imaginamos Como Luz, de Payal Kapadia (Índia)
- Emilia Pérez, de Jacques Audiard (França)
- A Semente do Fruto Sagrado, de Mohammad Rassoulof (Alemanha)
- Kneecap – Música e Liberdade, de Richard Peppiatt (Irlanda)
MELHOR LONGA DOCUMENTÁRIO
- No Other Land (Palestina-Israel)
- Diários da Caixa Preta (Japão)
- Daughters (EUA)
- Will & Harper (EUA)
- Super/Homem: A História de Christopher Reeve (EUA)
MELHOR LONGA DE ANIMAÇÃO
- Flow (Letônia)
- Wallace & Gromit: Avengança (Reino Unido)
- Robô Selvagem (EUA)
- Divertida Mente 2 (EUA)
MELHOR DIREÇÃO
- Sean Baker, por Anora
- Brady Corbet, por O Brutalista
- Edward Berger, por Conclave
- Denis Villeneuve, por Duna: Parte 2
- Jacques Audiard, por Emilia Pérez
- Coralie Fargeat, por A Substância
MELHOR ATRIZ
- Cynthia Erivo, por Wicked
- Demi Moore, por A Substância
- Karla Sofía Gascón, por Emilia Pérez
- Marianne Jean-Baptiste, por Hard Truths
- Mikey Madison, por Anora
- Saoirse Ronan, por The Outrun
MELHOR ATOR
- Adrien Brody, por O Brutalista
- Colman Domingo, por Sing Sing
- Hugh Grant, por Herege
- Ralph Fiennes, por Conclave
- Sebastian Stan, por O Aprendiz
- Timothée Chalamet, por Um Completo Desconhecido
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
- Ariana Grande, por Wicked
- Felicity Jones, por O Brutalista
- Isabella Rossellini, por Conclave
- Jamie Lee Curtis, por The Last Showgirl
- Selena Gomez, por Emilia Pérez
- Zoe Saldaña, por Emilia Pérez
MELHOR ATOR COADJUVANTE
- Clarence Maclin, por Sing Sing
- Edward Norton, por Um Completo Desconhecido
- Guy Pearce, por O Brutalista
- Jeremy Strong, por O Aprendiz
- Kieran Culkin, por A Verdadeira Dor
- Yura Borisov, por Anora
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
- Sean Baker, por Anora
- Brady Corbet & Mona Fastvolt, por O Brutalista
- Rich Peppiatt, Naoise Ó Cairealláin, Liam Óg Ó Hannaidh & Jj Ó Dochartaigh, por Kneecap – Música e Liberdade
- Jesse Eisenberg, por A Verdadeira Dor
- Coralie Fargeat, por A Substância
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
- James Mangold & Jay Cocks, por Um Completo Desconhecido
- Peter Strauhan, por Conclave
- Jacques Audiard, por Emilia Pérez
- RaMell Ross & Joslyn Barnes, por Nickel Boys
- Clint Bentley & Greg Kwedar, por Sing Sing
MELHOR FOTOGRAFIA
- Lol Crawley, por O Brutalista
- Stéphane Fontaine, por Conclave
- Greig Fraser, por Duna: Parte 2
- Paul Guilhaume, por Emilia Pérez
- Jarin Blaschke, por Nosferatu
MELHOR FIGURINO
- Jacqueline Durran, por Blitz
- Arianne Phillips, por Um Completo Desconhecido
- Lisy Christl, por Conclave
- Linda Muir, por Nosferatu
- Paul Tazewell, por Wicked
MELHOR MONTAGEM
- Sean Baker, por Anora
- Nick Emerson, por Conclave
- Joe Walker, por Duna: Parte 2
- Juliette Welfling, por Emilia Pérez
- Julian Ulrichs, por Kneecap – Música e Liberdade
MELHOR CABELO & MAQUIAGEM
- Duna: Parte 2
- Emilia Pérez
- Nosferatu
- A Substância
- Wicked
MELHOR TRILHA SONORA
- Daniel Blumberg, por O Brutalista
- Volker Bertelmann, por Conclave
- Clément Ducol, por Emilia Pérez
- Robin Carolan, por Nosferatu
- Kris Bowers, por Robô Selvagem
MELHOR DESIGN DE PRODUÇÃO
- Judy Becker, por O Brutalista
- Suzie Davies, por Conclave
- Patrice Vermette, por Duna: Parte 2
- Craig Lathrop, por Nosferatu
- Nathan Crowley, por Wicked
MELHORES EFEITOS ESPECIAIS
- Better Man: A História de Robbie Williams
- Duna: Parte 2
- Gladiador 2
- Planeta dos Macacos: O Reinado
- Wicked
MELHOR SOM
- Blitz
- Duna: Parte 2
- Gladiador 2
- A Substância
- Wicked