Academia de Cinema da Europa destaca “Valor Sentimental”, “Foi Apenas um Acidente” e os polêmicos “Sirât” e “Tardes de Solidão” de um toureiro
Foto: “Valor Sentimental”, de Jochim Trier
Por Maria do Rosário Caetano
O cinema da França e da Espanha assume a linha de frente na disputa pelo European Film Awards, outorgado há 38 anos pela Academia Europeia de Cinema (a láurea nasceu como Prêmio Felix).
A França reúne o maior número de filmes indicados às principais categorias, até porque produziu “Foi Apenas um Acidente”, do iraniano Jafar Panahi, e “A Voz de Hind Hajab”, da tunisiana Kaouther Ben Hania. Nenhum dos dois é falado em francês ou elabora temática ligada à história ou cultura do país. O filme de Panahi é 100% iraniano (trama, diretor, atores e ambientação). O mesmo se pode dizer do longa da cineasta Ben Hania, que conta trágica história palestina. O país dos Irmãos Lumière destaca-se, também, na categoria animação, pois ocupa três das cinco vagas, e de melhor atriz (idem).
A Espanha, que vive grande momento cinematográfico, brilha na principal categoria do prêmio (longa ficcional), com o polêmico e instigante “Sirât” (e mais direção, para Oliver Laxe, ator, para o catalão Sergí Lopez, e roteiro, parceria do diretor com Santiago Filol). Brilha, ainda, na categoria documentário. E tem chances de ganhar o Troféu Europa com o belíssimo e sensorial “Tardes de Solidão”, de Alberto Serra, que deixou a turma da Cahiers du Cinéma em estado de êxtase. O documentário ganhou capa da bíblia da cinefilia e passou por completa exegese em oito páginas. Até na animação o país de Buñuel tem destaque (com “Olivia y el Terremoto Invisível”, de Irene Iborra Rizo).
Berlim, na Alemanha, sediará a entrega das estatuetas europeias no dia 17 de janeiro. O país tem representação de razoável destaque na competição, graças ao filme “O Som da Queda”, de Mascha Schilinski, premiado em Cannes e indicado para representar o cinema germânico no Oscar de filme internacional. Cabe à realizadora representar o cinema feminino na categoria melhor direção do Prêmio Europeu (tendo Panahi, Laxe, Trier e Yorgos Lanthimos, de “Bugônia”, como concorrentes).
O grego Lanthimos vem fazendo carreira de muita exposição e sucesso, tendo a Grã-Bretanha como território-base e a atriz Emma Stone como musa e alavancadora de projetos. Depois de causar sensação no Oscar com “A Favorita” e, principalmente, “Pobres Criaturas”, o diretor helênico-britânico vê “Bugônia” reduzido a uma única indicação da Academia Europeia de Cinema.
Outro diretor que já brilhou no Oscar e nos festivais, o italiano Paolo “A Grande Beleza” Sorrentino é outro que teve destaque moderado nas indicações do Europeu de número 38: melhor roteiro e melhor ator, para o notável Toni “Il Divo” Servillo, recém-laureado com a Copa Volpi, em Veneza.
O Reino Unido também não se destaca na lista de finalistas dessa edição do Prêmio Europeu. Só cravou um candidatura significativa (“A Sombra do meu Pai”, de Akinola Davies Jr) na categoria Descoberta (a ser analisada pelo júri da Fipresci). Embora seja radicado em Londres, o cineasta realizou um filme 100% nigeriano (roteiro, ambientação e elenco africano). Mas seu país de origem não o reconheceu como um filme da Nigéria. Preferiu ficar sem candidato, a respaldá-lo. “A Sombra do meu Pai” é uma narrativa de base realista, mas banhada em fantasmagorias. Tem estreia comercial garantida no Brasil.
O Oscar de melhor filme internacional vem pautando suas escolhas por regras cada vez mais elásticas. Tanto que a Academia de Hollywood aceitou o filme britânico, made in Nigéria, como representante do Reino Unido. Mesmo que ele seja integralmente falado em inglês. Em tempos idos, a categoria filme internacional era destinada a produções faladas em outros idiomas (não o inglês).
A imprensa especializada europeia tem o norueguês “Valor Sentimental” como franco favorito na festa de janeiro de 2026. Pelo menos na lista de finalistas ao Prêmio Europeu, a opção da França em indicar um filme 100% iraniano como seu representante parece colocar o vencedor de Cannes (o longa de Panahi) em segundo lugar. Mesmo que some três indicações de peso.

O norueguês (de Trier) e o espanhol (Sirât) brilham, respectivamente, em cinco e quatro das categorias principais, ajudados por seus elencos notáveis. “Valor Sentimental” deve render o Europeu a Renate Reinsve, a estrela nórdica, que já brilhara em “A Pior Pessoa do Mundo”. E tem o sueco Stellan Skargärd, de 74 anos, concorrendo a melhor ator.
Sergí Lopez enfrentará, na competição da Europa unida, um peso-pesado, o ator italiano Toni Servillo. Mas pode surpreender. A Academia Europeia não se empolgou com os atores de “Foi Apenas um Acidente”. Preferiu a prata-da-casa. A sorte está lançada.
Nas categorias melhor atriz e melhor ator, destacam-se veteranos que, há décadas, encantam a Europa, como a ítalo-francesa Valeria Bruni Tedeschi (na pele da atriz Eleonora Duse, 1858-1924, dirigida por Pietro Marcelo), o dinamarquês Mads Mikkelsen, de 60 anos (“Amnésia Criminosa”) e o sueco Stellan Skargärd (“Valor Sentimental”, de Joachim Trier, Noruega). Do time jovem, destaca-se Idan Weiss, de 28 anos, que interpreta o escritor Franz Kafka (1883-1924) em filme da polonesa Agniezka Holland.
Confira os finalistas do European Film Awards:
Melhor longa ficcional
. “O Som da Queda”, de Mascha Schilinski,(Alemanha)
. “Valor Sentimental”, de Jochim Trier (Noruega)
. “Sirât”, de Oliver Laxe (Espanha)
. “Foi Apenas um Acidente”, de Jafar Panahi (França, Irã)
. “A Voz de Hind Hajab”, de Kaouther Ben Hania (França, Tunísia)
Melhor longa documental
. “Tardes de Solidão”, de Albert Serra (Espanha)
. “Riefensthal”, de Andres Veiel (Alemanha)
. “Com Hasan em Gaza”, de Kamal Aljafari (Palestina, Alemanha, França, Catar)
. “Fiume o Morte!”, de Igor Bezinovic (Croácia, Eslovênia e Itália)
. “Songs of Slow Burning Earth”, de Olha Zhurba (Ucrânia, França)
Melhor longa de animação
. “Olivia y el Terremoto Invisível”, de Irene Iborra Rizo (Espanha, França)
. “Amelie et la Métaphysique des Tubes (Little Amelie), de Mailys Vallade e Liana-Cho Han (França)
. “Arco”, de Ugo Bienvenu (França)
. “Dog of God” (Dieva Suns), de Ritis Abele e Laurie Abele (Letônia e EUA)
. “Thales From the Magic Garden”, de Súkup, Pass, Vidmar e Rozec (República Tcheca, Eslovênia e França)
Melhor direção
. Mascha Schilinski, por “O Som da Queda” (Alemanha)
. Joachim Trier, por “Valor Sentimental” (Noruega)
. Jafar Panahi, por “Foi Apenas um Acidente” (França)
. Oliver Laxe, por “Sirât” (Espanha)
. Yorgos Lanthimos, por “Bugônia” (Reino Unido)
Melhor atriz
. Valeria Bruni Tedeschi (Duse”, de Pietro Marcelo, Itália)
. Vicky Krieps (“Love me Tender”, de Anna Cazenave Cambet, França)
. Léa Drucker (“Dossier 137”, de Dominique Moll, França)
. Leonie Benesch (“Heldin” – Late Shift, de Petra Volpe (Suíça e Alemanha)
. Renate Reinsve (“Valor Sentimental”, de Joachim Trier, Noruega)
Melhor ator
. Toni Servillo (“La Grazia”, de Paulo Sorrentino, Itália)
. Sergí Lopez (“Sirât, de Oliver Laxe, Espanha)
. Mads Mikkelsen (“Amnésia Criminosa” ou “Último Viking”), de Anders Thomas Jensen (Dinamarca)
. Stellan Skargärd (“Valor Sentimental”, de Joachim Trier, Noruega)
. Idan Weiss (“Franz”, de Agniezka Holland, República Tcheca, Alemanha, Polônia)
Melhor roteiro
. Paulo Sorrentino, por “La Grazia” (Itália)
. Eskil Vogt e Joachim Trier, por “Valor Sentimental” (Noruega)
. Mascha Schilinski e Louise Peter, por “O Som da Queda” (Alemanha)
. Santiago Filol e Oliver Laxe, por “Sirât” (Espanha)
. Jafar Panahi, por “Foi Apenas Um Acidente” (França)
Melhor filme segundo o Público Jovem
. “The Acidentally Wrote a Book”, de Nóra Lakos (Hungria e Países Baixos)
. “La Vita da Grandi” (“Silings”), de Greta Scarano (Itália)
. “Arco”, de Ugo Bienvenu (França)
Prêmio European Discovery” (Prêmio Fipresci)
. “A Sombra do meu Pai”, de Akinola Davies Jr (Reino Unido e Nigéria)
. “On Falling”, de Laura Carreira (Portugal, Irlanda)
. “One of Those Days When Hemme Dies”, de Murat Firatogiu (Turquia)
. “Sauna”, de Mathias Broe (Dinamarca)
. “Under the Grey Sky”, de Mara Tamkovich (Polônia)
. “Little Trouble Girls”, de Urska Djukic (Eslovênia, Itália, Croácia e Sérvia)
Prêmio Lux Audience
. “Love me Tender”, de Anna Cazenave Cambet (França)
. “Deaf” (Sorda), de Eva Libertad (Espanha)
. “Cristy”, de Brendan Canty (Irlanda e Reino Unido)
. “Foi Apenas um Acidente”, de Jafar Panahi (França e Irã)
. “Valor Sentimental”, de Joachim Trier (Noruega)
