Netflix apresenta três séries reveladoras sobre a Segunda Guerra Mundial

Por Maria do Rosário Caetano

Algum filme de Hollywood sobre a Segunda Guerra Mundial mostrou soldados usando drogas para aguentar dias seguidos de combate? Ou pelotões (tanto nazifascistas, quanto Aliados) matando rivais, feitos prisioneiros, por vingança?

Quem assistir, na Netflix, a três séries sobre os principais personagens e as mais cruentas batalhas da maior guerra da história da humanidade, terá respostas às perguntas acima e a outras, tão incômodas quanto.

Vale destacar três delas: houve excessos das Forças Aliadas ao destruir a cidade de Dresden, um polo cultural alemão? Mulheres, incluindo snipers, tiveram presença marcante nos combates? Que papel desempenharam a Inglaterra, os EUA e a União Soviética na derrota do nazismo?

A melhor das três séries, a mais reveladora e bem construída, é “Grandes Momentos da Segunda Guerra Mundial – Em Cores”. A ela somam-se “La Segunda Guerra Mundial en Colores” (título muito parecido e, talvez por isso, grafado em espanhol) e “Hitler e o Círculo do Mal”. Essas duas não alcançam o mesmo nível de excelência da primeira, mas nos revelam novas análises do mundo que gerou aquela que os russos chamam de Grande Guerra Patriótica.

Estudiosos vindos das mais importantes universidades inglesas, estadunidenses, germânicas e um especialista russo se unem para compor, com sólidos depoimentos, “Grandes Momentos da Segunda Guerra Mundial – Em Cores”. Depois de ver os seus dez capítulos, concluímos que dois países desempenharam papel de ponta no conflito: a Inglaterra de Winston Churchill e a URSS de Joseph Stálin (por mais que se odeie o tirano soviético, ninguém há de negar a importância dele e de seus principais generais, Chuikov e Zhukov, no cruento conflito).

Os EUA, claro, também jogaram papel fundamental e de imenso valor. A ação de Franklin Delano Roosevelt e seus generais foram de importância imensa. Mas seu país não teve seu território continental invadido e devastado, nem perdeu milhões de homens (e mulheres) em combate, como aconteceu com a URSS e a Inglaterra.

Quando, em 1945, os Aliados conseguiram derrotar Hitler e seus parceiros (Japão, Itália e elites de muitos países europeus e asiáticos), a Europa era um monte de escombros e tinha que ser reconstruída. Os norte-americanos, com seu Plano Marshall, estavam prontos para fazê-lo. E o fizeram. Financiaram a reconstrução de um continente devastado. E, também, do Japão, onde, por mais paradoxal que pareça, mantiveram o Imperador Hiroito no poder.

Os dez capítulos de “Grandes Momentos da Segunda Guerra Mundial – Em Cores” são de excelente qualidade. Mas três são os mais estimulantes, seja por sua riqueza de imagens (colorizadas de forma discreta), seja pela originalidade de seus enfoques.

O primeiro capítulo – “Guerra Relâmpago” (Blitz Krieg) – já nos introduz num mundo brutal. Os tanques nazistas vão varrendo tudo e conquistando territórios. Nenhuma força parece capaz de detê-los. Hitler e seus generais assistem à expansão da suástica pelo mapa europeu. A Áustria se entrega com alegria às forças do Fuhrer. Caem Holanda e países nórdicos. Ao leste, a Tchecoslováquia é dominada. Depois, a Polônia. A França, que orgulhava-se de ter um dos melhores exércitos do mundo, cai vergonhosamente. Sua elite católica pactua com o invasor e o governo títere de Pétain estabelece-se em Vichy. Nada parece deter a força do Eixo germano-ítalo-japonês. Ela parece avassaladora, invencível.

O capítulo cinco (“A Batalha de Stalingrado”) é o mais original e impressionante. Os criadores da série reconhecem o papel do Exército Vermelho neste que foi um dos momentos mais terríveis do conflito. Depois de passar pela Ucrânia e conquistar parte significativa de seu território (que era soviético), os estrategistas de Hitler resolvem entrar no território russo, a mais importante das Repúblicas Soviéticas. Querem o petróleo e outras riquezas essenciais em um conflito de dimensão mundial. Stalingrado transforma-se numa ruína, milhares de cidadãos comuns morrem. E Stálin exige que os que restaram lá permaneçam. O cerco dura de julho de 1942 até fevereiro de 1943. Portanto, mais de seis meses de combates, bombardeios, incêndios que ardiam por dias a fio, pavor e fome. Enquanto isso, os generais soviéticos montam seu plano de revide (a Operação Urano). Com a cidade dominada pelos nazistas, eles só podem chegar pelos flancos e foi o que fizeram. Tática denominada “ataque em pinça” conseguiu cercar os nazistas, que sem comida e exaustos, depois de sangrentos combates, renderam-se. O comandante Friedrich Paulus assinou a rendição, mesmo sem a autorização de Hitler.

Com imagens poderosas, muitas vindas de registros de grandes cinegrafistas soviéticos – Jay Leyda, em “Kino – História del Film Russo y Soviético”, registra o trabalho de dezenas deles, com destaque para Roman Karmen –, a Batalha de Stalingrado, finalmente, conquista seu merecido papel histórico numa produção ocidental. Foi, portanto em solo soviético, que Hitler sofreu sua primeira e maior derrota. A Frente Oriental começava a transformar-se em um pesadelo para Hitler. Na Frente Ocidental, Inglaterra e EUA comandavam batalhas que seriam essenciais ao triunfo final.

A série não esconderá o lado mais escuro da guerra. Soldados dos dois lados recorrendo ao consumo de drogas, distribuídas para que não dormissem, para que permanecessem alertas por dias seguidos. O estimulante Pervitin era conhecido como “a arma secreta dos super-soldados de Hitler”. Os norte-americanos também tinham seus super-estimulantes. Hitler, dirá a série, “era usuário de cocaína e de substância assemelhada à heroína”.

Outra barbárie aceita pelos comandantes de tropas (inclusive Aliadas): a vingança. Ou seja, depois de ganha uma batalha, centenas (até milhares) de opositores, feitos já prisioneiros, eram mortos a sangue frio.

Quase tão impressionante quanto o capítulo 5 (“Stalingrado”) é o oitavo: “O Bombardeio de Dresden”. A série mostra que a bela cidade alemã, um polo cultural dos mais importantes da Europa, com patrimônio arquitetônico e artístico de valor imensurável, não representava perigo especial na decisão do conflito. Mesmo assim, foi arruinada pela artilharia Aliada.

Completam a série os episódios “A Batalha da Grã-Bretanha”, “Pearl Harbor”, “A Batalha de Midway”, “O Dia D”, “A Batalha do Bulge”, “A Libertação de Buchenwald” e, o último, “Hiroshima”.

Por falar na cidade japonesa destruída pela bomba atômica, vale evocar importante registro. A nova e mais completa biografia de Churchill (“Caminhando com o Destino”), escrita por Andrew Roberts assegura que o primeiro-ministro britânico é coautor, junto com Harry Truman, da decisão de bombardear Hiroshima e Nagasaki. Muitos acreditam que a guerra já estava ganha, tais bombardeios não se mostravam necessários. Os dois mandatários preferiram impor dura lição ao mais decidido dos aliados de Hitler, o Japão. A série “Grandes Momentos da Segunda Guerra Mundial – Em Cores” não aborda esta cumplicidade de Churchill com Truman.

“La Segunda Guerra Mundial en Colores” tem narrativa mais tradicional. Mas serve como rico complemento à produção britânica. Já “Hitler e o Círculo do Mal” é um documentário seriado (em dez capítulos) que recorre, abertamente, a recursos ficcionais, espetaculares, inclusive a um certo suspense. E à reconstituição com atores, ou seja, ao docudrama. Mas sua potência vem dos arquivos, usados com profusão.

Quem quiser conhecer os mais poderosos colaboradores de Hitler (Göring, Himmler, Heydrich, Hess, Goebbels, entre outros), terá nessa atração da Netflix, uma fonte impressionante (e amedrontadora, em especial nesse momento histórico que estamos vivendo, com líderes de extrema direita assumindo postos de mando em muitas nações europeias, americanas e asiáticas).

Dois registros finais. Primeiro: sim, as mulheres, mostra a ótima série britânica, desempenharam papel fundamental na Frente Oriental (na URSS, em especial), inclusive como snipers (atiradoras de elite). Segundo: nenhuma das três séries abre espaço aos “partisans” (resistência antifascista), que com suas nações ocupadas pelo Eixo, lutaram ao lado do Aliados. Como o tema “Segunda Guerra Mundial” tem plateia cativa e fiel, fica sugestão à Netflix (ou Amazon, ou Mosfilm) para a produção de uma nova série. Até porque terá, para animá-la, um dos hits de nosso tempo, a canção “Bella Ciao”, que a série “Casa de Papel” resgatou com força avassaladora.

 

Grandes Momentos da Segunda Guerra Mundial – Em Cores, em dez capítulos de média de 50 minutos cada

La Segunda Guerra Mundial en Colores (título mantido em espanhol pela Netflix), em 12 capítulos: A Tempestade se Avizinha, A Guerra Relâmpago, Grã-Bretanha Contida, Hitler Ataca o Leste, O Sol Nascente Desenfreado, O Mediterrâneo e o Norte da África, Virando a Maré, O Rolo Compressor Soviético, Senhor, Fechando o Cerco, Guerra na Ilha, Vitória na Europa, Vitória no Pacífico

Hitler e o Círculo do Mal, em dez episódios: Heróis e Desajustados, Reagrupando, A Queda de Röhm, O Avanço do Antissemitismo, O Grupo de Berghof, A Loucura de Rudolf Hess, Ascensão e Queda de Reinhard Heydrich, A Ascensão dos Bajuladores, O Começo do Fim, Colapso

One thought on “Netflix apresenta três séries reveladoras sobre a Segunda Guerra Mundial

  • 20 de julho de 2021 em 18:52
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    Lá segunda guerra mundial a todo color ( título em espanhol) é um milhão de vezes melhor q o ” grandes momentos da segunda guerra” q mais parece uma versão resumo q a Netflix fez só pra levar algum créditos. Acho até q não explica metade da guerra.

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