Direitos de execução pública, um dever dos exibidores

A criação e escolha da trilha sonora de uma obra audiovisual, especialmente aquelas destinadas originariamente ao mercado cinematográfico, é, sem sombra de dúvidas, uma das etapas mais importantes do processo de produção de um filme.

Sabemos também que é uma etapa que demanda uma série de negociações entre o produtor e os titulares de direitos sobre as obras musicais que comporão a trilha sonora, que precisam autorizar a sincronização da sua obra a obra audiovisual.

Essa autorização é obrigatória e decorre da Lei nº 9.610/98 – a Lei de Direitos Autorais, que determina em seu artigo 29, inciso V, que a inclusão de obra intelectual protegida em produção audiovisual depende de autorização prévia e expressa de seu titular.

Em decorrência desse dispositivo de Lei é que inúmeras Licenças de Sincronização são firmadas todos os anos no Brasil.
Ocorre que essa Licença, firmada entre o titular da música e o produtor da obra audiovisual, não representa uma cessão total de direitos que permitiria exibições públicas da obra musical inserida indefinidamente.

Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro optou por um sistema restritivo de proteção aos direitos autorais, que exige que cada modalidade de utilização de uma obra intelectual seja expressamente autorizada por seu titular.

Nesse sentido, a execução pública de uma obra musical ou lítero-musical sincronizada em uma obra cinematográfica, como modalidade distinta de utilização de obra intelectual, tal como determina o artigo 68 da Lei nº 9.610/98, também deverá ser autorizada por seus titulares.

Resta saber quem é o responsável por obter essa autorização e se ela deve ser concedida por cada um dos milhares de titulares de direitos de obras musicais executadas diariamente nas salas de cinema.

Imaginar que cada um dos titulares teria que autorizar mediante contrato a execução de sua obra já nos dá uma ideia de que alguma solução mais viável operacionalmente tenha sido encontrada pelos operadores do Direito.

De fato, foi criado o sistema de gestão coletiva de direitos autorais, que centraliza em uma única entidade a tarefa de autorizar e cobrar pelos direitos de execução pública de obras musicais e lítero-musicais.

Através da gestão coletiva, o titular do direito autoral é representado por uma associação constituída para o fim específico de, em seu nome, conceder autorizações e cobrar a remuneração decorrente da utilização realizada por terceiros. A constituição de associações de autores, artistas ou intérpretes e produtores fonográficos é regulada pelo disposto nos artigos 97 a 100 da Lei nº 9.610/98, sendo que, ao filiar-se a uma associação esta torna-se mandatária do associado para a prática de todos os atos necessários à defesa judicial ou extrajudicial de seus direitos autorais, bem como para sua cobrança, tal como determina o artigo 98 do referido diploma legal.

No caso específico do exercício do direito de execução pública de obra musical e fonogramas, o artigo 99 da Lei nº 9.610/98 prevê que as associações de titulares deverão manter um único escritório central com a finalidade de “arrecadação e distribuição, em comum, dos direitos relativos à execução pública das obras musicais e lítero-musicais e de fonogramas, inclusive por meio da radiodifusão e transmissão por qualquer modalidade, e da exibição de obras audiovisuais”.

Assim, aqui no Brasil, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD é o responsável por conceder as autorizações, mediante a devida remuneração, para a execução pública das obras musicais e lítero-musicais inseridas nas obras audiovisuais exibidas nas salas de cinema do país.

Já os responsáveis pelo pagamento desses mesmos direitos autorais, são, sem dúvida nenhuma, as empresas exibidoras, que, no desenvolvimento regular de suas atividades, executam publicamente as obras inseridas nos filmes por elas exibidos. Tanto é verdade, que a própria Lei de Direitos Autorais, em seu artigo 86, determina que “os direitos autorais de execução musical relativos a obras musicais, lítero-musicais e fonogramas incluídos em obras audiovisuais serão devidos aos seus titulares pelos responsáveis dos cinemas que as exibirem”.

Por fim, ressaltamos que essa posição deriva da própria Lei de Direitos Autorais e da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, responsável pela padronização da interpretação das leis federais, que já consolidou o entendimento de que as empresas exibidoras são as responsáveis pelo pagamento de direitos autorais de execução pública das trilhas sonoras dos filmes.

 

Por Camila Saad, advogada do escritório Cesnik, Quintino e Salinas Advogados, especializado em entretenimento e terceiro setor.

One thought on “Direitos de execução pública, um dever dos exibidores

  • 12 de fevereiro de 2017 em 01:41
    Permalink

    Olá, Dra. Camila!
    Estou com dúvidas entre a diferença entre execussão musical pública e privada.

    Se o ECAD proíbe uma empresa particular de colocar som ambiente, isso caracteriza, de acordo com a interpretação do ECAD, uma execussão pública?

    Grato

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