Prêmio Platino destaca ano de ouro do cinema espanhol e deixa Brasil fora de todas as categorias

Por Maria do Rosário Caetano

Mais uma vez o cinema brasileiro fica de fora da competição aos Prêmios Platino, destinados, anualmente, aos melhores filmes e séries ibero-americanos.

OK, este é o ano da Espanha, que ocupa metade das quatro vagas na categoria principal com dois recordistas em indicações – “A Sociedade da Neve” (foto), de Juan Antonio Bajon (em sete categorias), e “Cerrar los Ojos”, do mestre Victor “Espírito da Colmeia” Erice (seis).

O México, com o inquieto “Tótem”, de Lila Avilés, e a Argentina, com o thriller “Os Delinquentes”, de Rodrigo Moreno, completam a lista dos grandes do ano.

A safra da terra de Buñuel-Saura-Almodóvar é tão forte, que coube ao ótimo “20.000 Espécies de Abelhas”, da basca Estibaliz Urresola, destacar-se nas categorias “opera prima” (filme de estreia) e “Educação em Valores”.

O Brasil só pega carona temática em um dos fortes concorrentes ao Platino de melhor filme de animação — “Atirem no Pianista”. O cineasta espanhol Fernando Trueba é apaixonado por nossa música e já dedicou um longa-metragem a Carlinhos Brown (“Milagre no Candeal”), e agora, em parceria com Javier Mariscal, apresenta um longa de animação (com base documental) sobre o trágico assassinato do músico carioca Tenório Jr (1941-1976), em Buenos Aires. O crime aconteceu nas semanas que antecederam (e  engendraram) o golpe militar que derrubou o governo de Isabelita Perón.

“Atiraram no Pianista”, além de ouvir as mais variadas vozes ligadas à trajetória do músico brasileiro, tece verdadeira ode à Bossa Nova. Mesmo assim, terá um forte rival a ameaçá-lo – “Robot Dreams”, de Pablo Berger. Este filme concorreu ao Oscar de melhor longa animado (perdeu para o japonês “O Menino e Garça”, de Hayo Miyazaki). Foi, portanto, um dos dois representantes da Espanha na festa da Academia de Hollywood (o outro foi “A Sociedade da Neve”, que concorreu a melhor filme internacional — perdeu para “Zona de Interesse”, do britânico Jonathan Glazer).

O Brasil não dispunha de nenhum filme digno de figurar entre os finalistas ao Platino?

Sim, dispunha. O caso mais evidente é o do longa “Noites Alienígenas”, do acreano Sérgio de Carvalho, vencedor do Festival de Gramado. Ele merecia estar entre os concorrentes a “opera prima” (melhor obra de diretor estreante). E Chico Diaz, brasileiro nascido no México, seria um formidável concorrente na categoria ator coadjuvante. Mas as relações do Brasil (essa imensa América Lusitana) é viver (não se sabe até quando) de costas para a América Hispânica (e vice-versa). E, por extensão, para a Península Ibérica. E, para complicar, tudo leva a crer que os filhos de Castela (em seus territórios europeus e da América Espanhola) não entendem a língua portuguesa, nem a estética e gramática dos filmes brasileiros. Daí que o Brasil, o maior produtor audiovisual da América Latina (com dados que se igualam ou superam os do México e Argentina), continua sendo o “patinho feio” do audiovisual que fala espanhol-e-ou-português.

Portugal, também, aparece muito pouco nas cerimônias do Platino. Mas, este ano, o país ibérico conquistou uma vaga importante. Concorre a melhor animação com “Nayola”, longa-metragem que José Miguel Ribeiro dirigiu, a partir de roteiro de Virgílio Almeida, inspirado em texto teatral (“A Caixa Preta”) dos romancistas Mia Couto e José Eduardo Agualusa. Com 70% de sua narrativa construída em animação e 30% com imagens “reais”, o filme apresenta três gerações de mulheres angolanas afetadas pela guerra civil (a avó Lelena, a filha Nayola e a neta Yara).

Historicamente, a Argentina (será desbancada pela Espanha?) é o país que mais indicações recebe nos Prêmios Platino. Esse ano, se não causou furor nas categorias cinematográficas, se fez notar especialmente nas séries e telefilmes.

O México, anfitrião pela terceira vez da festa do audiovisual ibero-americano, terá presença significativa. Emplacou vaga de “melhor filme ficcional” com o inquieto “Tótem”, de Lila Avilés, e viu o comovente e mobilizador “Radical”, de Christopher Zalia, destacar-se na categoria “Educação em Valores” (dedicada a filmes que poderíamos chamar de “utilidade pública”, por seu humanismo e defesa das boas causas). Em “Radical”, o astro Eugenio Derbet (“Não se Aceitam Devoluções”) brilha na pele de um professor idealista e ousado.

A produção mexicana marca presença, também, com a animação “Home is Somewhere Else”, de Jorge Villalobos e Carlos Hagerman, parceria com os EUA (sobre imigrantes mexicanos ‘indocumentados’, que tentam a vida no poderoso país vizinho), e com “Huesera”, de Michelle Garza. Este longa disputa duas categorias técnicas (montagem e edição de som). Não se pode esquecer, também, que um dos astros mais destacados do México – o ótimo Damián Alcazar – é o protagonista absoluto do longa peruano “El Caso Monroy”, de Josué Méndez. E concorre ao Platino de melhor ator.

“Huesera” é um filme de gênero, em diálogo com o terror. Assim como o argentino “O Mal que nos Habita” (“Cuando Acecha la Maldad”), de Demián Rugna, lançado no Brasil com bom resultado de público (quase 200 mil espectadores). Os dois vão disputar o Platino em categoria hipervalorizada pelo gênero – a edição de som.

Aos poucos, os filmes de horror vão ganhando espaço na premiação organizada pela Egeda e Fipca, instituições ligadas à coleta de direitos autorais e à produção ibero-americana. Para ajudá-las na complexa realização dos Prêmios Platino, Egeda e Fipca mantêm parceria com Academias cinematográficas de países da Península Ibérica e de toda a América Latina.

O Chile tem, esse ano, representação das mais significativas. Já agraciado com “Glória”, de Sebastian Lélio, protagonizado por Paulina García, e com “Uma Mulher Fantástica”, também de Lélio, o país viu o satírico “O Conde”, de Pablo Larraín, receber seis indicações (empatando com “Cerrar los Ojos”).

Embora não tenha ocupado vaga na categoria principal, o filme que transporta Augusto Pinochet para o mundo dos vampiros, disputa categorias importantes como melhor direção, melhor ator (Jaime Vadell, um Pinochet diabólico) e roteiro (Guillermo Calderón e Pablo Larraín). Mais um filme em diálogo com o horror.

Na categoria “melhor documentário”, o país andino conta com concorrente fortíssimo: “A Memória Infinita”, de Maite Alberdi, finalista ao Oscar 2024. E traz novidade importante no campo televisivo: forte candidato a melhor minissérie ou telefilme — “Los Mil Días de Allende” (quatro episódios). Esta realização de Nicolás Acuña conta com elenco liderado por Pablo Capuz e o carismático Alfredo Castro.

A décima-primeira cerimônia de premiação dos melhores filmes e séries do cinema e TV ibero-americanos acontecerá na Riviera Maya, no México, no complexo turístico Xcaret. A atriz argentina Cecila Roth, que atuou sob o comando de Pedro Almodóvar em meia dúzia de filmes (incluindo o belíssimo “Tudo sobre minha Mãe”), receberá o Platino de Honor, láurea que já foi entregue, entre outros, à brasileira Sonia Braga, ao espanhol Antonio Banderas, ao argentino Ricardo Darín e à portorriquenha Rita Moreno.

O Canal Brasil transmitirá a festa dos melhores do cinema ibero-americano no dia 20 de abril, a partir das 21h45.

Confira os indicados:

CINEMA

MELHOR FILME (ficção)

“Cerrar los Ojos”, de Vitor Erice (Espanha)
“A Sociedade da Neve, de J.A. Bajon (Espanha)
“Tótem”, de Lila Avilés (México)
“Os Delinquentes, de Rodrigo Moreno (Argentina)

MELHOR ANIMAÇÃO

“Atiraram no Pianista”, de Fernando Trueba e Javier Mariscal (Espanha)
“Robot Dreams”, de Pablo Berger (Espanha)
“Nayola”, de José Miguel Ribeiro (Portugal)
“El Sueño da la Sultana”, de Isabel Herguera (Espanha)
“Home is Somewhere Else”, de Jorge Villalobos e Carlos Hagerman (México-EUA)

MELHOR DOCUMENTÁRIO

“A Memória Infinita”, de Maite Alberdi (Chile)
“Una Jauría Llamada Ernesto”, de Everardo González (Chile)
“El Juicio”, de Ulises de la Orden (Argentina)
“La Memoria del Cine, una Película sobre Fernando Méndez-Leite”, de (Espanha)

MELHOR OBRA DE ESTREIA (Opera Prima)

“20.000 Espécies de Abelhas”, de Estibaliz Urresola (Espanha)
“Blondi”, de Dolores Fonzi (Argentina)
“La Pecera” (Porto Rico)
“Los Colonos” (Chile)
“Simón” (Venezuela)
“Tengo Sueños Eléctricos” (Costa Rica).

MELHOR COMÉDIA

“Bajo Terapia”, de Gerardo Herrero (Espanha)
“Los Wanabis”, de Santiago Paladines (Equador)
“Norma”, de Santiago Giralt (Argentina)
“Te Estoy Amando Locamente”, de Alejandro Marin (Espanha).

PRÊMIO PLATINO EM EDUCAÇÃO DE VALORES

“Radical”, de Christopher Zalia (México)
“20.000 Espécies de Abelhas”, de Estibaliz Urresola (Espanha)
“La Memória Infinita”, de Maite Alberdi (Chile)
“Puan”, de María Alché e Benjamin Naishat (Argentina)

MELHOR DIREÇÃO

Isabel Coixet (“Un Amor”, Espanha)
Juan Antonio Bayona (“A Sociedade da Neve”, Espanha)
Lila Avilés (“Tótem”, México)
Pablo Larraín (“O Conde”, Chile)

MELHOR ATRIZ

Carolina Yuste (“Saben Aquell”, Espanha)
Dolores Fonzi (“Blondi”, Argentina)
Laia Costa (“Un Amor”, Espanha)
Lola Amores (“La Mujer Salvaje”, Cuba)
Malena Alterio (“Que Nadie Duerma”, Espanha)

MELHOR ATOR

Damián Alcazar (“El Caso Monroy”, Peru)
David Verdaguer (“Saben Aquell”, Espanha)
Enzo Vogrincic (“A Sociedade da Neve”, Espanha)
Jaime Vadell (“El Conde”, Chile)
Marcelo Subiotto (“Puan”, Argentina)

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE

Ana Torrent (“Cerrar los Ojos”, Espanha)
Ane Gabarain (“20.000 Espécies de Abelhas, Espanha)
Antonia Zegers (“El Conde”, Chile)
Alejandra Flechner (“Puan”, Argentina)

MELHOR ATOR COADJUVANTE

Jose Coronado (“Cerrar los Ojos”, Espanha)
Luis Bermejo (“Un Amor”, Espanha)
Matías Recalt (“A Sociedade da Neve”, Espanha)
Leonardo Sbaraglia (“Puan”)

MELHOR ROTEIRO

Estibaliz Urresola (20.000 Espécies de Abejas, Espanha)
Michel Gaztambide e Víctor Erice (“Cerrar los Ojos”, Espanha)
Guillermo Calderón e Pablo Larraín (“O Conde”, Chile)
Rodrigo Moreno (Os Delinquentes, Argentina)

MELHOR MÚSICA ORIGINAL

Pascual Reyes e Juan Pablo Villa (“Radical”, México)
Alfonso Vilallonga (“Robot Dreams”, Espanha)
Pedro Osuna (“Blondi”, Argentina)
Sergio de la Puente (“La Pecera”, Porto Rico)

MELHOR MONTAGEM

Adriana Martínez (“Huesera”, México)
Andrés Gil e Jaume Martí (“A Sociedade da Neve”, Espanha)
Carolina Siraqyan (“A Memória Infinita”, Chile)
Manuel Ferrari, Nicolás Goldbart e Rodrigo Moreno (“Os Delinquentes”, Argentina)

MELHOR DIREÇÃO DE ARTE

Curru Gabal (“Cerrar los Ojos”, Espanha)
Julieta Dolinski (“Puan”, Argentina)
Rodrigo Bazaes (“El Conde”, Chile)
Sebastián Orgambide (“Los Colonos”, Chile)

MELHOR FOTOGRAFIA

Valentín Álvarez (“Cerrar los Ojos”)
Pedro Luque (“A Sociedade da Neve”, Espanha)
Inés Duacastella e Alejo Maglio (“Os Delinquentes”, Argentina)
Simón Brauer e Tomás Astudillo (“Lo Piel Pulpo”, Equador)

MELHOR EDIÇÃO DE SOM

Pablo Isola (“O Mal que nos Habita”, Argentina)
Miguel Hormazábal (“O Conde”, Chile)
Christian Giraud e Omar Pareja (“Huesera”, México)
Jorge Adrados, Oriol Tarragó e Marc Orts (“A Sociedade da Neve”, Espanha)

TELEVISÃO

MELHOR MINISSÉRIE OU TELESSÉRIE

“Los Mil Días de Allende” (Chile)
“Barrabrava” (Argentina)
“El Cuerpo en Llamas” (Espanha)
“Iosi, El Espía Arrepentido S2” (Argentina)

MELHOR CRIADOR DE MINISSÉRIE OU TELESSÉRIE

Alex de la Iglesia (“30 Monedas T2”, Espanha)
Daniel Burman (“Iosi, El espía Arrepentido S2”, Argentina)
Juan Pablo Kolodziej (“El amor Después del Amor”, Argentina)
Santiago Korovsky (“División Palermo”, Argentina)

MELHOR ATOR (MINISSÉRIE OU TELESSÉRIE)

Alfredo Castro (“Los Mil Días de Allende”, Chile)
Javier Cámara (“Rapa”, Espanha)
Santiago Korovsky (“División Palermo”)
Gustavo Bassani (“Iosi, El Espía Arrepentido S2”, Argentina)

MELHOR ATRIZ (MINISSÉRIE OU TELESSÉRIE)

Aline Küppenheim (“Los Mil Días de Allende”, Chile)
Micaela Riera (“El Amor Después del Amor”, Argentina)
Lola Dueñas (“La Mesías”, Espanha)
Úrsula Corberó (“El Cuerpo en Llamas”, Espanha)

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE (MINISSERIE OU TELESSÉRIE)

Carmen Machi (“La Mesías”, Espanha)
Nawja Nimri (“30 Monedas T2”, Espanha)
Minerva Casero (“Iosi, El espía Arrepentido S2”, Argentina),
Pilar Gamboa (“División Palermo”, Argentina)

MELHOR ATOR COADJUVANTE (MINISSÉRIE OU TELESSÉRIE)

Andy Chango (“El Amor Después del Amor”, Argentina)
Daniel Hendler (“División Palermo”)
Emilio Zurita (“La Cabeza de Joaquín Murrieta”, México)
Manolo Solo (“30 Monedas T2”, Espanha)

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