FAM premia “Soñé su Nombre, documentário da Colômbia”, “El Tiempo del Sol”, do Paraguai, e o curta “La Falta”, da Argentina

Foto: Ángela Carabalí, com o troféu de melhor filme pelo júri oficial, por “Soñé su Nombre”

Por Maria do Rosário Caetano, de Florianópolis (SC)

A Colômbia conquistou, com o longa documental “Soñé su Nombre” (Sonhei seu Nome), o Troféu Panvision de melhor filme do FAM (Florianópolis Audiovisual Mercosul). A escolha foi feita pelo júri oficial, formado com a cineasta Eliza Capai, o crítico argentino Juan Pablo Cinelli e o distribuidor Ibirá Machado. Já o júri popular preferiu o paraguaio “Kuarahy Ára – El Tiempo del Sol” (“o tempo do sol”, em guarani e espanhol), de Hugo Gamarra, também um longa documental.

O Brasil marcou posição discreta no terreno do longa-metragem. Venceu a Mostra WIP (Working in Progress, ou filme em finalização) com “Al-Buhaya”, de Lucas Moro e Manuel Rossel, projeto de coprodução com a Espanha. A escolha se deu pelo veredito do júri oficial. Já o público (Teste da Audiência) preferiu o peruano “Donde Duermen los Sueños”, de Daniel Riglos.

No campo do curta-metragem, Argentina e Colômbia brilharam. O primeiro com o sintético e fascinante “La Falta”, de Carmela Sandberg, eleito o melhor no formato. Numa escola, vemos uma criança que aguarda a chegada da mãe. Mas esta não chegará, por razão de força maior. Os professores tentam construir um local de acolhimento para a pequena aluna.

Já o colombiano “¡Salsa!”, de Antonina Kerguelén Román, prêmio especial do júri, constrói-se como musical inclusivo, sensorial e banhado em sons caribenhos. Dois ótimos curtas.

A produção catarinense, que conta com competição própria, viu dois de seus cinco curtas se destacarem. Ambos ficcionais. “A Lua dos Beijos Silentes”, de Mika Queiroz, recebeu o Troféu Panvision de melhor filme do estado-anfitrião (pelo júri oficial e pelo júri especial Imprensa Catarinense).

Já o júri popular preferiu “Adelante, Professora”, de Ana Laura Baldo, protagonizado pela atriz Sandra Corveloni, Palma de Ouro em Cannes 2008, por seu desempenho em “Linha de Passe”, de Walter Salles e Daniela Thomas.

Ana Laura, jornalista profissional, prometeu transformar seu curta-metragem (ela assina o roteiro e a direção) em matriz de seu primeiro longa, que manterá o mesmo nome.

“Adelante, Professora” situa sua trama em torno da vida profissional de Marta (Corveloni). Ela ministra aulas de História. Mas acabará hostilizada por aluno adolescente e por seu pai, que se dirigirá ao colégio para exigir “punição para esta professora comunista”.

A Imprensa Catarinense atribuiu menção honrosa ao curta “Mascates de Sonhos”, de Kristel Kardeal, sólido documentário construído com ótimos depoimentos sobre a luta de circos populares por sua sobrevivência. O filme foi rodado em quatro cidades catarinenses (Blumenau, Itajaí, Penha e Florianópolis).

O Brasil só conquistou mais um prêmio em categoria em que houve disputa com produções hispano-americanas, a de videoclipe. O vencedor foi “D’África – Preto Tipuá”, de Chico Rasta, representante do Piauí.

O curta paranaense “Mãos Rapper”, de Giuliano Robert, venceu a Mostra Especial Lei Paulo Gustavo, criada para valorizar filmes produzidos pelo mecanismo de fomento que leva o nome do protagonista de “Minha Mãe é uma Peça”. O comediante, nascido em Niterói, morreu vítima de complicações do vírus da Covid, em 2021, aos 42 anos.

O filme de Giuliano Robert, de caráter inclusivo, levou sua equipe ao palco por três vezes. Para receber o prêmio do júri oficial, do júri popular e menção honrosa da RECAM (Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do Mercosul).

A cerimônia de premiação foi longa e cansativa. Não por excesso de prêmios. Para a mostra principal, a de longas latino-americanos, destina-se um único Troféu Panvision, o de melhor filme. Existe a possibilidade de um prêmio especial (o júri não quis recorrer a esse complemento). A noite de premiação se alongou por causa da discurseira desabrida e pela prolixidade dos agradecimentos (principalmente da equipe de “Mãos Rapper”).

Vibração para valer só se viu no segmento do festival dedicado ao Rally FAM, maratona que produziu, pela sétima vez, cinco curtas no exíguo prazo de 100 horas (ininterruptas). Trinta alunos, oriundos de vários países da América Latina, chegaram a Florianópolis e foram divididos em cinco equipes. Orientados por mentores, sob liderança do experiente Iván Molina, a moçada criou seus curtas, em quatro dias e noites insones.

O resultado do Rally FAM foi surpreendente. Filmes de significativa qualidade foram mostrados ao público no telão do Cine Show Beiramar. O melhor deles — “Meia-Noite”, da Equipe 1 — perdeu para “Noah”, da Equipe 3. Mas deixou boa lembrança, pois com rara síntese e sem diálogos, contou a história de jovem que, mesmo esgotada pelo trabalho repetitivo na cozinha de um restaurante, encontra energias capazes de levá-la a se esbaldar na balada da meia-noite.

Há que se perguntar: o grande premiado do FAM, o longa-metragem “Soñé su Nombre”, fez por merecer o Troféu Panvision (estilizado numa Bernúncia, ser mítico do folguedo do Boi Mamão)?

Sim. Dos seis filmes em competição, ele foi, junto com o paraguaio “El Tiempo del Sol”, o que de melhor se viu no telão do Cine Show Beiramar.

O longa colombiano mostra a jornada de Ángela Carabalí, sua realizadora, que empreende, país adentro e em companhia da irmã Juliana, jornada em busca da figura paterna, um agricultor de origem afro, que cultivava arroz, em parceria com comunidade indígenas. Depois de ter seus tratores roubados, o lavrador tentou o que pôde para recuperá-los. Não conseguiu. Acabou vítima de desaparecimento forçado.

Décadas depois, Ángela sonhou com o pai. E resolveu buscá-lo (seu corpo ou sua memória) junto com a irmã. Nesse road movie existencial, a cineasta mergulha na história de sua família e, por extensão, na de seu país, marcado pela violência. Embora o filme exagere no apelo à videoarte (fotos na água, imagens fixas sob camada de arroz etc.), ele exala sinceridade, amor filial e esperança.

Hugo Gamarra recebeu o prêmio de melhor filme pelo júri popular, por “Kuarahy Ára – El Tiempo del Sol”

O longa documental paraguaio, “El Tiempo del Sol”, escolhido pelo público, também conta história pessoal, a de Hugo Gamarra, criador e diretor da Cinemateca de Assunção, criada em 1989.

Na adolescência, ele assistiu a um singelo documentário sobre família radicada na zona rural de Abaí, pequeno povoado na província de Caazapá. O curta-metragem fora realizado pelo documentarista francês Dominique Dubosc.

Gamarra nunca se esqueceu daquelas imagens. Resolveu, décadas depois (o filme de Dubosc foi realizado em 1968), buscar os integrantes da família Cabral Pereira e o autor do filme, nascido na China, filho de pai diplomata francês.

Depois de quase 20 anos de busca, Gamarra conseguiu concluir seu longa-metragem, somando as imagens registradas por Dubosc a evocações cinematográfico-cinéfilas retiradas de filmes dos Irmãos Lumière, de Robert Flaherty (“Nanook, o Esquimó”), Buster Keaton (diversos deles), Dziga Vertov (“O Homem e sua Câmara”) e Charles Chaplin (“O Bombeiro”). Sem esquecer cinejornal que documentou visita do presidente Charles de Gaulle ao ditador Alfredo Strossner, que governou o Paraguai por 25 anos.

A participação brasileira na competição de longas-metragens latino-americanos se deu com o documentário baiano “Aprender a Sonhar”, de Vitor Rocha. O filme prometia um mergulho na força transformadora das cotas, mecanismo que abriria espaço em universidades para brasileiros de origem indígena e afro.

O realizador encontrou personagens maravilhosas. Uma delas, uma jovem muito magra, será vista com sua incansável mãe, também muito magra, na faina pesada em modesto sítio. E se formará em Medicina na histórica UFBA (Universidade Federal da Bahia). Outra será uma moça exuberante que passou por sistemas de ressocialização (“fiz muita coisa errada na vida”). Um indígena Pataxó Aragwaksã, que se formou em Direito, se destacará, da mesma forma que ousada militante pelos direitos das mulheres periféricas.

Faltou, porém, a Vitor Rocha, a necessária concentração na vida de seus personagens. O filme se dispersa em festa interminável dos Pataxó Aragwaksã e na discurseira de uma manifestação de mulheres da periferia. O documentário teria ganho organicidade e potência se concentrasse o olhar de sua câmara na força das imagens. Como ele fez, com brilho, no registro da mãe da futura médica, que enfrentou longas distâncias e a pobreza até chegar ao exercício de seu ofício. Com a velha senhora, que cuida de porcos, patos e pega no cabo da enxada, não há palavrório jogado ao vento. Há, isto sim, um retrato de figuras maternas que labutam, sem descanso, para permitir aos filhos o estudo do qual não puderam usufruir.

“Al-Buhaya”, o vencedor da Mostra WIP, acompanha, na Península Ibérica, uma brasileira, Jessi. Ela deixou seu país natal para tentar a sorte em Albufera, na Valência espanhola, onde tentará preservar o legado de Luís, um velho pescador, com quem aprendera técnicas de pesca tradicional (e artesanal).

Só que, com o retorno do filho do pescador, Jessi é forçada a deixar seu ofício e partir em busca de novos meios de sobrevivência. Ela se arriscará como promotora de passeios de barco.

O comando do FAM, liderado pelos irmãos Marilha Naccari e Tiago Santos, anunciou a data da trigésima edição do evento, agendada para a primeira semana de setembro de 2026 (de três a nove). E prometeram “continuar lutando pela integração do cinema latino-americano e ibérico”.

“Este ano” — comemoraram — “contamos com a participação da Espanha e de Portugal na Mostra WIP e com o patrocínio do Fundo Ibermedia, que apoiou 12 projetos, defendidos por profissionais vindos de muitos países para participar do Rally FAM. Foram oferecidas 24 becas (bolsas de estudo)”.

Confira os vencedores:

Longa-metragem

. “Soñé su Nombre”, de Ángela Carabalí (Colômbia) – melhor filme pelo júri oficial
. “Kuarahy Ára – El Tiempo del Sol”, de Hugo Gamarra Etcheverry (Paraguai) – melhor filme pelo júri popular
. “Al-Buhaya”, de Lucas Moro e Manuel Rossel (Brasil-Espanha) – melhor filme da mostra WIP (Work in Progress)
. “Donde Duermen los Sueños”, de Daniel Riglos (Peru) – Premio Player da mostra WIP (júri oficial) e prêmio do júri popular

Curta-Metragem

. “La Falta”, de Carmela Sandberg (Argentina-Uruguai) – melhor filme pelo júri oficial
. “¡Salsa!”, de Antonina Kerguelén Román  (Colômbia) – Prêmio Especial  do júri oficial
. “Rainha”, de Raul de Lima (Pará) – melhor filme pelo júri popular
. “Mãos Rapper”, de Giuliano Robert (Paraná) – melhor curta da mostra Especial  Lei Paulo Gustavo pelo Júri Oficial e pelo Júri Popular
. “Americana”, de Agarb Braga (Pará) – menção honrosa do júri oficial
. “A Lua dos Beijos Silentes”, de Mika Queiroz (Florianópolis) – melhor filme catarinense pelo júri oficial e e melhor filme pelo Júri Especial

Imprensa Catarinense

. “Adelante, Professora”, de Ana Laura Baldo (Florianópolis) – melhor filme catarinense pelo júri popular
. “Mascates de Sonhos”, de Kristel Kardeal (Blumenau, Itajaí, Penha, Florianópolis) – Menção honrosa do Júri Especial Imprensa Catarinense
. “Não é Sobre Pastéis”, de Tiago Ribeiro (MG) – melhor filme infanto-juvenil pelo júri oficial
. “A História de Ayana”, de Cristiana Giustino, de Luana Dias – melhor filme infanto-juvenil pelo júri popular
. “À Flor da Pele”, de Danielle Villanova (Rio-Bahia) – melhor filme da Mostra Petrobras Online pelo júri popular  (YouTube FAM)
. “Noah”, de Alessandra Gomes da Silva, Ana Priscila Cayres de Oliveira, Denizeli Cardoso, Welington Hors, Pedro Schneider e Jannier Hurtado Gomez (Equipe 3) – melhor filme do Rally Panvision pelo júri oficial
. “D’África – Preto Tipuá”, de Chico Rasta (Piauí) – melhor videoclip pelo júri oficial
. “Filosa – Serena Ciga & Pochebeats” , de Ezequiel Soma (Argentina) – melhor videoclip pelo júri popular
. “Le Pétit et le Géant”, de Isabela Costa (Brasil – França) – melhor filme pelo júri oficial RECAM (Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do Mercosul)

. Menções Honrosas da RECAM para “Coisa de Preto”, de Pâmela Peregrino (Sergipe); “Mãos Rapper”, de Giuliano Robert (Paraná) e “Mitã’i Churi”, de Elian Guerin (Argentina – Paraguai)

2 thoughts on “FAM premia “Soñé su Nombre, documentário da Colômbia”, “El Tiempo del Sol”, do Paraguai, e o curta “La Falta”, da Argentina

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.