“O Homem de Ouro” e “Assalto à Brasileira” colocam cinema policial brasileiro na poderosa vitrine da Mostra SP

Foto: “O Homem de Ouro”, de Mauro Lima

Por Maria do Rosário Caetano

A Mostra Internacional de São Paulo exibe dois filmes – “O Homem de Ouro” e “Assalto à Brasileira” – filiados a uma das mais férteis vertentes do cinema brasileiro, a que antagoniza agentes da lei e bandidos.

Nosso cinema policial e suas derivações registram histórico de grandes sucessos de bilheterias. “Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia”, de Hector Babenco, vendeu quase 6 milhões de ingressos. “Tropa de Elite”, de José Padilha, passou dos 11 milhões.

“O Homem de Ouro” tem como personagem central o policial Mariel Mariscot (1940-1981). Sua trama, escrita e dirigida por Mauro Lima, dá imenso destaque à atriz Darlene Glória, uma das mulheres – e mãe de um dos filhos – de Mariscot. A narrativa enreda outros nomes do show bis, ao abrir generoso espaço para o cantor Agnaldo Timóteo e para a travesti (“da família brasileira”) Rogéria (1943-2017), nascida Astolfo Barroso Pinto.

O motorista de Timóteo — mostra o filme — seria um pequeno “passador” de maconha, que acabaria agregado à entourage de colaboradores de Mariscot. O cantor teria espaço privilegiado no círculo íntimo do vistoso guarda-vidas de ensolaradas praias, admitido por concurso na Polícia da Guanabara. E que logo se envolveria com a Scuderie Le Cocq e ajudaria a criar o Esquadrão da Morte.

Mariel Mariscot tornou-se um dos “Doze Homens de Ouro” da Polícia do Governador Chagas Freitas, comandada por militar de alta patente (interpretado pelo ator Aramis Trindade). Rogéria, que era maquiadora de Darlene Glória e de outras estrelas, teria um ruidoso affair com o policial-galã.

A segunda, e última, sessão de “O Homem de Ouro” na Mostra SP acontecerá nessa quinta-feira, dia 23 (Espaço Petrobras Augusta, 15h20). Já “Assalto à Brasileira”, que revive desastrado (e quase cômico) assalto ao Banestado (Banco do Estado do Paraná), em Londrina, 1987, tem duas sessões programadas. A primeira, na segunda-feira, 27 (Reserva Cultural, 21h40). Depois, na terça (Espaço Petrobras Augusta, 15h25). O filme de Belmonte chega a São Paulo depois de ótima recepção no Festival de Brasília. Foi eleito, pelo público, o melhor da competição e teve dois dos integrantes de seu numeroso elenco premiados – Murilo Benício (melhor ator) e Cristian Malheiros (melhor coadjuvante).

“Assalto à Brasileira”, de José Eduardo Belmonte

O cinema brasileiro recorreu à reconstituição de crimes de morte e assaltos desde o início do século passado. Só o Crime da Mala – registram pesquisas de época – teria gerado dois filmes de mesmo nome (“O Crime Sinistro”) e, provavelmente, um terceiro, do qual há pistas não-conclusivas. Mas a década de ouro do cinema policial brasileiro se daria, para valer, nos anos 1960. Com o sucesso de crítica (e de público) de “Assalto ao Trem Pagador” (Roberto Farias, 1962), dezenas de outros títulos viriam a público. O próprio cineasta fluminense fechara a década anterior com “Cidade Ameaçada” (1959) sobre o bandido Promessinha.

Além de Farias, outro nome, o de Jece Valadão, iria se impor na década que viu os “Doze Homens de Ouro” transformarem-se em policiais-bandidos, artífices (escorados em autoridades políticas e endeusados pela imprensa) do Esquadrão da Morte. Capixaba como Darlene, Valadão (1930-2006) tinha rosto duro e anguloso, que parecia talhado para interpretar bandidos e contraventores do jogo do bicho. Ele se via como um Humphrey Bogart dos trópicos.

O ator capixaba dedicaria ao filme policial seus mais empenhados esforços. Protagonizou, com gosto, muitos deles – interpretando desde personagens ficcionais de Nelson Rodrigues, como o bicheiro de “Boca de Ouro”, até recriações da vida de criminosos estigmatizados pela imprensa, como o Paraíba de “Paraíba Vida e Morte de um Bandido”. Sem esquecer o policial Mariel Mariscot, protagonista absoluto de “Eu Matei Lúcio Flávio” (Antonio Calmon, 1979). Assaltante de banco de olhos verdes e oriundo da classe média, Lúcio Flávio Villar Lírio só apareceria no final do filme, interpretado por um Paulo Ramos de cabelos oxigenadíssimos.

Valadão continuou, como diretor, a explorar a vertente dos filmes inspirados nas páginas sangrentas do jornais (“A Lei do Cão”, “Matador Profissional”, “Os Amores da Pantera”, este sobre o assassinato de Angela Diniz por Doca Street, e “A Noite dos Assassinos”). Muitas vezes, somava as funções de produtor e diretor à de ator. E conheceria muitos sucessos comerciais.

Quem estiver interessado no “Homem de Ouro” de Mauro Lima, muito ganhará se antes assistir à serie documental “Homens sem Lei” (A&E e, em breve, no streaming), dirigida por José Tapajós e escrita pelo diretor com parceiros da pesada (Bruno Paes Manso e Gabriel Priolli) e o olhar feminino de Flávia Kamenetz.

O quarteto de roteiristas engendrou denso mergulho nos crimes mais vistosos das décadas de 1960 e 70. Os nomes dos cinco episódios (média de 45 minutos cada) dão bem um guia do que o espectador verá: “Matar Bandido é um Prazer”, “Cara de Cavalo Morreu Insultando os Policiais”, “Escuderie Le Cocq: Admirados ou Temidos?”, “Herói Popular ou Grande Vilão – A Captura de Mineirinho” e, por fim, “Mariel Mariscot, o Policial Fora da Lei”.

Para mergulhar na história de personagens como Cara de Cavalo, Mineirinho, Sérgio Gordinho e do policial-bandido Mariscot (sem esquecer do detetive Perpétuo de Freitas, que combateu o Esquadrão da Morte), a trupe de “Homens sem Lei” estabeleceu firme diálogo com a arte brasileira. Seja pelas criações do artista visual Hélio Oiticica, seja por escritos de Clarice Lispector ou depoimentos de Nélida Piñon e Carlos Vergara. E com vigoroso destaque a trechos de filmes brasileiros – “Mineirinho Vivo ou Morto”, “Perpétuo Contra o Esquadrão da Morte”, “Paraíba Vida e Morte de um Bandido”, “República dos Assassinos” e, até, um inusitado “Ali Babá e os 40 Ladrões”, com Didi e Dedé e… Mariel Mariscot.

Sim, o policial foi “ator” no filme dirigido por Victor Lima. E apaixonou-se por uma das atrizes da trama proto-trapalhônica (o quarteto tornar-se-ia fonte geradora de blockbusters pouco tempo depois). A jovem atriz se chamava Elza de Castro e daria uma filha, Marielza (soma de Mariel e Elza), a Mariscot. Aliás, o depoimento de Marielza à série é muito corajoso. Impressiona, também, o depoimento de Selva Villar, a irmã de Lúcio Flávio.

A série de Tapajós retira sua maior força dos depoimentos de inúmeros jornalistas. O mais impressionante deles sai da boca (e de lampejos autocríticos) de Luarlindo Ernesto. Que figura! A ele se somam outros pesos-pesados do jornalismo policial brasileiro (Aguinaldo Silva, hoje teledramaturgo, Percival de Souza, sem esquecer o craque Bruno Paes Manso, que além de usar seu bisturi feito de palavras para radiografar nossa tragédia policial, é um dos roteiristas da série). E, ainda, a rara presença feminina entre os praticantes do jornalismo policial — a repórter Cecília Oliveira. O episódio final, dedicado ao policial-bandido-galã Mariel Mariscot é muito revelador. O dedicado a Cara de Cavalo, o mais impressionante.

“O Homem de Ouro” acrescenta algo aos filmes anteriores, aqueles que trataram Mariel Mariscot por seu próprio nome? Ou o disfarçaram atrás de nome fictício (caso do Mateus de “República dos Assassinos”)? O filme tem cacife para transformar-se em um blockbuster?

Não é fácil prever. O novo longa de Mauro Lima soma muitas qualidades e alguns problemas.

Sua maior qualidade é dar merecido coprotagonismo a Darlene Glória. Quem espantou-se com a convocação da baixinha Luísa Arraes, para interpretar a volumosa e gloriosa Darlene, terá que dar o braço a torcer. A pequena estatura da atriz, os seios desprovidos da fartura darlenística e, principalmente, a ausência daquela boca capaz de exalar desejo a cada sorriso só incomodam quando Luísa Arraes entra em cena. Mas à medida que o papel vai crescendo, a atriz mignon mostra seu talento. E nos envolve.

Luísa Arraes, em cena de “O Homem de Ouro”

A Revista de CINEMA solicitou a um dos produtores do filme, João Roni, alguns esclarecimentos sobre este que é o décimo longa-metragem de Mauro Lima.

Primeiro: o Rodrigo Brandão que aparece entre os produtores-associados do filme é o filho de Darlene Glória e Mariel Mariscot? A resposta é: sim!

Quem é Peter Brandão, que figura o elenco? Um neto de Darlene?

“Não!”. Trata-se “do ator que interpreta Sabará, pequeno traficante que se tornará motorista do cantor Agnaldo Timóteo”. Essa é a resposta de Roni.

Mauro Lima, por sua vez, autor solitário do roteiro, garante que “todos os personagens, todas as histórias e sequências, têm base real”. E sobre Sabará, ele acrescenta: “o personagem só teve o nome, aliás, o apelido, mudado. O original era Cromado. Ele foi apresentado ao Timóteo por Mariel e era informante, motorista e agregado do Esquadrão (da Morte)”. Antes disso, fora “bandidinho na Cinelândia e de outras áreas. Alguns nomes foram mudados, mas não todos”.

Quanto custou o longa-metragem, que dura 140 minutos, tem elenco (quase) estelar e créditos técnicos (fotografia, direção de arte, figurinos) de primeira?

Resposta de João Roni: R$8 milhões.

Como Mauro Lima aparece nos créditos do filme na condição de coautor da trilha sonora, ao lado do respeitado trilheiro Bena Ceppas, perguntamos a ele: “você é o letrista das canções”?

Com a chinfra costumeira, ele respondeu: “Sim, fiz as letras, que não se prezam pela sofisticação”. Às vezes, “curtíssimas, às vezes, só o refrão, às vezes, só duas estrofes”.

“O Homem de Ouro” foi concebido para ser um filme policial denso e capaz de denunciar a barbárie advinda da prática da “justiça pelas próprias mãos”. Ou seja, a “justiça” praticada por integrantes do aparelho de Estado, autorizados a matar quem desejarem, sem a devida submissão ao processo judicial.

Nesse propósito, o filme de Mauro Lima vai longe. Mariel e os outros onze ‘Homens de Ouro’ (em especial os mais próximos do policial-bandido-galã) são mostrados como sanguinários justiceiros, pagos pelos cofres do estado da Guanabara, para exterminar bandidos, de pés-de-chinelo a assaltantes de banco. E, ainda, colocar sobre os “presuntos”, adorno macabro. Um cartaz com caveira cruzada com duas tíbias e as iniciais EM (Esquadrão da Morte). Que eles diziam, na cara dura, referenciar o Esquadrão Motorizado.

Para mostrar o que significaram a Scuderie Le Cocq e o Esquadrão da Morte no final da década de 1960 e sua permanência no Brasil de nossos dias, Mauro Lauro construiu uma primeira parte de sua narrativa em preto-e-branco, à qual faltou o sedutor mistério do cinema noir. Uma parte, registre-se, meio-travada, pois os diálogos são longos e soam por demais explicativos. Quando o filme ganha cor e a vedete Darlene Glória, linda, louca e desbocada entra em cena, a narrativa cresce. Os diálogos se impregnam de agilidade e a trama diz a que veio.

O personagem de Orã Figueiredo, um radialista de extrema-direita, ganha interpretação capaz de expor seu reacionarismo, sem recorrer ao histrionismo ou à caricatura. Nos deparamos com uma representação do passado e sua sobrevivência no presente. Uma materialização dos cultores do “bandido bom é bandido morto”, alimento das hostes bolsonaristas. Estas com características incomodamente histriônicas. Como registra, na série “Homens da Lei”, o Delegado Sivuca (1930-2021). Ele repetiu infinitas vezes (inclusive no Programa de Jô Soares): “bandido bom é bandido morto e enterrado na vertical para economizar espaço”.

O protagonista de “O Homem de Ouro”, interpretado por Renato Góes, segura o desafio que lhe foi oferecido. Mas poderia ter adotado maior agressividade corporal, ser mais sedutor. Afinal, o mulherengo e hiperssexualizado Mariel Mariscot, que a namorada Rogéria definiu (para Antonio Abujamra, na TV Cultura) como “um machão que enlouquecia as mulheres”, exigia (cobrava) mais transgressão erótica. Não é qualquer um que enlouquece mulheres do calibre da explosiva Darlene Glória e lindas coristas de shows musicais, passando por filhas de políticos e empresários. E que procurava travestis como a própria Rogéria. Aguinaldo Silva, que conheceu Mariscot de perto, garante (em “Homens sem Lei”) que ele exibia, em espaços públicos, a namorada Rogéria. Andava com ela por bares e casas noturnas.

A relação de Mariscot com Darlene Glória, com a imprensa e altos estamentos do poder policial (e com Lúcio Flávio, não desenvolvida no filme de Mauro Lima, pois bem explorada em obras anteriores) era, sim, bem conhecida. Em “O Homem de Ouro”, a novidade está na presença de Rogéria e, principalmente, de Agnaldo Timóteo e de seu motorista. Que rende bons momentos na larga trama do filme.

A trilha sonora de “O Homem de Ouro” deixa a desejar. Claro que a trilha incidental é ótima. Mas, no uso de nossa poderosa música popular, o filme falha. Ao invés de – como fizeram magistralmente Antônio Pinto e Fernando Meirelles (“Cidade de Deus”) – botar pra quebrar com hits guardados em nosso imaginário (canções de Cartola, o sambalanço de Simonal, a voz poderosa de Tim Maia), Ceppa e Lima resolveram abrir mão de custosos gastos com aquisição de direitos autorais de sucessos brasileiros.

As canções utilizadas no filme acabam anódinas. O que justificou tal economia, num filme que evoca o final dos anos 1960, início dos 70? Vai entender.

Já “Assalto à Brasileira”, de Belmonte, tem tudo para estourar, pois soma trama policial, humor e muita música em trilha sacudidíssima (Miguel Gustavo, Titãs, Sérgio “Bloco na Rua” Sampaio e Rita Lee). Inspirado, entre outros filmes, em “Um Dia de Cão” (Sidney Lumet, 1975), o longa belmontiano é um espetáculo vivo e talhado para cativar o público. E foi feito com ótimo elenco (além dos premiados em Brasília, destaque para Paulo Miklos, dessa vez, ao lado das forças policiais, Robson Nunes, Matheus Macena e Hugo Possolo). Ver, na Revista de CINEMA, matéria sobre a participação (e debate) de “Assalto à Brasileira” no Festival de Brasília.

Do “Crime da Mala” ao Assalto do Banestado

No livro “70 Anos de Cinema Brasileiro” (Editora Expressão de Cultura, 1966), Paulo Emilio Salles Gomes e Adhemar Gonzaga tentaram contar o que acontecera na produção cinematográfica brasileira, desde os anos finais do século XIX, até a sexta década do século XX. No formato álbum, com fotografias raras, vindas em grande parte do poderoso acervo de Gonzaga, a dupla produziu textos-legendas de grande valor histórico.

Destacamos dois trechos, pois ambos dão conta do impacto de crimes no imaginário dos espectadores brasileiros.

Na página 17, Salles Gomes e Gonzaga registram “títulos que resumem a crônica policial do tempo: a professorinha de São Paulo que anavalhou o noivo na sexta-feira de Carnaval” (e que seria evocada no filme “Noivado de Sangue” ou “Tragédia Paulista”). E mais: “Um assassinato que ficou famoso nos círculos mundanos no Rio e inspirou ‘Um Drama na Tijuca’. O referido drama evoca ato do “estrangulador Miguel Trad, que esquartejou sua vítima, Elias Farad, despachando-a numa mala”.

Dois filmes sobre “O Crime da Mala” foram realizados e lançados no mesmo ano. E com o mesmo título – “A Mala Sinistra”. Um foi realizado pelos produtores Antônio Leal e José Labanca, o outro por Marc Ferrez, que enviou o filho a São Paulo e Santos em busca de detalhes e locações reais. Um terceiro produtor, Alberto Botelho, teria, também, dedicado um filme ao mesmo crime.

Na página 35 de “70 Anos do Cinema Brasileiro”, Gomes e Gonzaga registram: “A ideia de que o crime compensa – pelo menos como enredo de filme – deve ter inspirado os responsáveis pelas produções que tentaram arrancar o cinema nacional do marasmo em que mergulhara”. Daí que “O Caso dos Caixotes’, também conhecido como ‘O Furto dos 1400 Contos’, inspirou-se num assalto sensacional”. E mais: “’O Crime de Paula Matos’ focaliza o assassinato do industrial Adolfo Freire por Augusto Henrique, nomes que encontravam muito eco na imaginação popular”. Os dois filmes, “realizados pelos Irmãos Botelho, eram em três partes, isto é, davam cerca de quarenta minutos de projeção”.

Há que se lembrar, como fazem os dois pesquisadores, que não foi só no eixo Rio-São Paulo que os crimes deram origem a filmes de grande apelo popular naqueles anos em que o cinema brasileiro dava seus primeiros passos.

“’O Crime dos Banhados’ era uma supermetragem com duas horas de projeção e seu produtor foi o velho ator português Francisco Santos, que se aposentara do palco e resolvera fazer cinema na cidade gaúcha de Pelotas”. Para tanto, Santos inspirava “sua fita num bárbaro episódio de recentes lutas políticas que haviam culminado no massacre de uma família inteira na Fazenda de Passo da Estiva”.

Até viver nova explosão na década de 1960, depois do imenso sucesso artístico e comercial de “Assalto ao Trem Pagador” (Roberto Farias, 1962), o cinema brasileiro se apaixonaria por outros gêneros. O melodrama, claro, seguia imbatível (vide o estrondoso sucesso de “O Ébrio”, de Gilda de Abreu, 1946). As décadas de 1930, 40 e 50 assistiriam ao sucesso dos filmusicais carnavalescos (ou chanchadas). A partir de 1953, com o estouro nacional e internacional de “O Cangaceiro” (Lima Barreto), o “nordestern” conquistaria espaço nobre. E a comédia, ah, a comédia!, esta seria um gênero de todas as épocas. Além das chanchadas, que somavam música e riso, estão aí nomes como os de Mazaroppi, Didi, Dedé, Mussum e Zacarias, Ingrid Guimarães e Paulo Gustavo, detentores de imensa cumplicidade com o público.

O gênero policial segue firme, forte e recorrente em nossa cinematografia. Principalmente no streaming, que transformou-se em poderoso escodouro de crimes midiáticos. De filhos que matam os pais, de maníacos do Parque, de mulher que esquarteja o marido. Quem, em nossos dias, percebeu este rico filão, entre nós, foi Marcelo Braga, produtor de “Assalto à Brasileira”. Escorado em sua empresa, a Santa Rita Filmes, ele pesquisou o interesse do público brasileiro por temas criminais e descobriu algo inesperado: “as mulheres compõem o segmento mais interessado por essas narrativas”.

Será? Ele reafirmou, convicto, em debate, na CineBH, em Minas Gerais, semanas atrás, que “os dados auferidos por suas pesquisas são eloquentes: 60% do público de séries criminais é formado por espectadoras”.

Braga levantou 30 crimes que abalaram a sociedade brasileira e consta de seus planos levar boa parte deles ao cinema (ou ao streaming). Ele, que já produziu sobre o crime de Suzane von Richthofen, série sobre o Maníaco do Parque e o longa “Assalto à Brasileira”, vai continuar por este caminho temático. Já tem quatro projetos sobre “crimes midiáticos” em fase de pré-produção ou produção. E garante que – como fez com o “Maníaco do Parque” – suas narrativas não mostrarão crimes gráficos, nem exploração de corpos femininos mutilados. “Todas as mulheres podem assistir à nossa série sobre o maníaco do Parque, pois a revisitamos pela perspectiva das vítimas”.

 

FILMOGRAFIA (alguns destaques)

DÉCADAS DE 1910 e 1920:

– “O Caso das Caixas” (ou “O Furto dos 1400 Contos”), dos Irmãos Botelho
– “Os Estranguladores”, de Francisco Marzullo
– “O Crime Sensacional” (“O Crime de Paula Mattos”), dos Irmãos Botelho, direção de Paulino Botelho
– “O Crime dos Banhados”, produção de Francisco Santos (Rio Grande do Sul)
– “Dioguinho”, uma produção da Paulista Filmes
– “Quadrilha do Esqueleto”, Produtora Veritas do Rio de Janeiro
– “Noivado de Sangue – Uma Tragédia Paulista”
– “A Mala Sinistra” (“Um Drama na Tijuca”) – dois filmes sobre “O Crime da Mala”

DÉCADA DE 1960:

– “Assalto ao Trem Pagador”, de Roberto Farias
– “Mineirinho Vivo ou Morto”, de Aurélio Teixeira
– “Paraíba, Vida e Morte de Um Bandido”, de Victor Lima
– “Perpétuo Contra o Esquadrão da Morte”, de Miguel Borges
– “O Bandido da Luz Vermelha”, de Rogério Sganzerla

DÉCADA DE 1970:

– Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia”, de Hector Babenco
–  “Ato de Violência”, de Eduardo Escorel (sobre Chico Picadinho)
– “O Caso Cláudia”, de Miguel Borges (caso Claudia Lessin)
– “República dos Assassinos”, de Miguel Faria Jr
– “Eu Matei Lúcio Flávio”, de Antônio Calmon
–  “Os Amores da Pantera”, de Jece Valadão

ANOS 2000:

– “Ônibus 174”, de José Padilha
– “Última Parada, 174”, de Bruno Barreto
– “Meu Nome Não é Johnny”, de Mauro Lima
– “Assalto ao Banco Central”, de Marcos Paulo
– “A Menina que Matou os Pais”, de Maurício Eça (visão dos Irmãos Cravinho)
– “O Menino que Matou meus Pais”, de Maurício Eça (visão de Suzane von Richthofen)
– “Angela”, de Hugo Prata (sobre o assassinato de Angela Diniz)
– “O Sequestro do Vôo 375”, de Marcus Baldini
– “Assalto à Brasileira”, de José Eduardo Belmonte
– “O Homem de Ouro”, de Mauro Lima

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