“Segredos em Família” marca encontro de Paulina García e Alfredo Castro em drama insular

Por Maria do Rosário Caetano

Os dois mais festejados e premiados atores do Chile, Paulina García, de “Glória”, e Alfredo Castro, o “Tony Manero” de Pablo Larraín, protagonizam, juntos e tardiamente, um longa-metragem. Trata-se de “Segredos em Família”, delicado título brasileiro para o nada sutil “Algunas Bestias”.

O diretor Jorge Riquelme Serrano preferiu não esconder o jogo ao batizar sua vigorosa narrativa, que reúne sete personagens, entre eles a ninfeta Consuelo Careño, fonte de frisson na última edição do Festival de Gramado, na pele de jovem levada a passeio de iate, junto com a irmã, pelo pai (o mesmo Alfredo Castro) por mares desertos. No thriller, “Immersion”, de Nicolás Postiglione.

“Algunas Bestias”, eleito a melhor opera-prima (filme de diretor estreante) no Festival de San Sebastián, na Espanha, e Prêmio Especial do Júri e melhor direção em Havana, chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 13 de outubro.

Os fãs de Paulina García e de Alfredo Castro vão encontrar os dois astros andinos em papeis que exigem muito deles. E ambos respondem à altura. Paulina interpreta Dolores, mulher rica, herdeira de terras, casada com Antônio, parasita refinado, acostumado a desfrutar do bom e do melhor ao lado (e às custas) dela. Os dois têm uma filha, Ana (Millaray Lobos), que casou-se com Alejandro (Gastón Salgado), rapaz de origem humilde. Ele faz tudo para ser aceito pelos sogros. Os dois são pais de Maximo (Andrew Bargested) e Consu (Consuelo Carreño), adolescentes acostumados ao bem-viver e ao mundo digital, com os hormônios à flor da pele.

Ana e Alejandro convidam os sogros para um final de semana num casarão plantado numa pequena e afastada ilha, bem ao sul do Chile. Levam os adolescentes. Caberá a um caseiro (Nicolás Zárate) cuidar da alimentação do grupo e devolvê-los ao continente. Bons vinhos, comidas especiais, noite gelada. Dolores se protege com peles e vinho, muito vinho. O marido e ela logo perceberão as intenções do genro: ele quer que a sogra venda uma de suas propriedades e empreste o dinheiro para que ele e Ana transformem a casa ilhenha em atrativo hotel rural.

Dolores e Antônio argumentam que não há internet, nada, nada naquele fim de mundo. Alejandro e Ana contra-argumentam que há milhares de pessoas intoxicadas pelo mundo urbano interessadas em fugir dele, vivenciar o oposto, o selvagem, o rústico, a Natureza intacta. A sogra, apoiada pelo marido, não cede.

Inesperadamente, o caseiro-barqueiro desaparece. A água potável torna-se escassa. Os problemas estruturais da “mansão” tornam-se cada vez mais evidentes. Vamos assistir a uma espécie de “O Anjo Exterminador” (Luis Buñuel, 1961)? Ou um filme de terror?

Nem um, nem outro. Riquelme, que escreveu o roteiro com Nicolás Diodovich, preferiu realizar um drama social, introduzindo o lado escuro do ser humano. Daquelas “bestias” que nos habitam. E continuará recorrendo a diálogos cortantes – os melhores envolvem caviar e lagosta e têm Dolores e Alejandro como contendores. São, também, notáveis, pois muito reveladores, os mantidos por Dolores e o marido, quando desprezam a origem do genro, um empreendedorzinho “desprezível, incapaz” vindo das campadas populares.

A sequência mais perturbadora de “Segredos em Família” se dará entre o avô Antônio e Consu, sua neta adolescente. Por sua angustiante ambiguidade. Nada se dará sem sutileza. Riquelme só esbanjou obviedade (e spoiler) no título de seu longa de estreia. Uma estreia promissora.

 

Segredos em Família | Algunas Bestias
Chile, 97 minutos, 2019
Direção: Jorge Riquelme Serrano
Elenco: Paulina García, Alfredo Castro, Millaray Lobos, Gastón Salgado, Consuelo Carreño, Andrew Bargested e Nicolas Zárate
Roteiro: Jorge Riquelme Serrano e Nicolás Diodovich
Produção: Jorge Riquelme Serrano
Fotografia: Eduardo Bunster
Edição: Jorge Riquelme e Valeria Hérnandez
Música: Carlos Cabezas
Distribuição: Imovision
Classificação:  18 anos

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