Mostra de Gostoso premia “Kasa Branca”, “Manas” e a alegria contagiante de “Hoje Eu Só Volto Amanhã”

Foto: Equipe de “Kasa Branca” recebe o prêmio do público de melhor filme © Sara De Santis

Por Maria do Rosário Caetano, de São Miguel do Gostoso (RN)

A Mostra de Cinema de Gostoso distribuiu, em noite encerrada pelo canto de “Luiz Melodia – No Coração do Brasil”, os troféus Luiz da Câmara Cascudo aos melhores filmes de sua décima-primeira, e concorridíssima, edição anual.

Os vencedores foram o carioca “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal, o escolhido do júri popular, e o pernambucano “Manas”, de Marianna Brennand, eleito pela imprensa.

Se não houve concordância na eleição do melhor longa-metragem, o Público e a Imprensa comungaram da mesma escolha na categoria de curta duração. O eleito foi a animação pernambucana “Hoje Eu Só Volto Amanhã”, de Diego Lacerda, verdadeira injeção de alegria (e irreverência) na veia dos espectadores. O filme se passa nas ladeiras de Olinda, onde a foliã Marina cai na frevança, disposta a aproveitar o carnaval como se não houvesse amanhã.

Luciano Vidigal, em seu primeiro longa solo (de nome sintético e evocativo, “Kasa Branca”), realiza crônica social, temperada com pitadas de humor, em torno de três amigos adolescentes, um deles, ocupado em amenizar os derradeiros dias de sua avó, Dona Almerinda, em estágio avançado de Alzheimer. O filme tem estreia marcada para a última semana de janeiro de 2025.

O escolhido pela imprensa especializada — “Manas” — vem somando troféus em diversos festivais. Tudo começou em Veneza, onde triunfou na Jornada dos Autores, prosseguiu no Festival do Rio (prêmio especial para a atriz protagonista Jamilli Corrêa) e na Mostra de São Paulo (Prêmio da Crítica). Marianna Brennand construiu, ao longo de dez anos e com muitos parceiros, sólido roteiro sobre tema dos mais complexos — o abuso sexual no seio familiar e em balsas que singram as abundantes águas da Ilha do Marajó.

O documentário “Bati da Vila: Memórias que Azeitam uma Tradição”, de Raquel Cardozo, foi o escolhido pela Mistika e DOT (prestadoras de serviços audiovisuais) como o melhor curta. Por isso, a realizadora potiguar recebeu prêmio no valor de R$8 mil (em serviços) a serem investidos em seu próximo projeto.

A dupla de empresas estabeleceu, ainda, prêmio especial Mistika-DOT (no valor de R$50 mil, também em serviços) para o projeto “A Alma de Teodorico”, primeiro longa-metragem do Coletivo Nós do Audiovisual.

O grupo, criado dez anos atrás, no pequeno município de São Miguel do Gostoso (10 mil habitantes), soma acervo composto com 30 documentários ficcionais ou documentais. Todos eles exibidos, sob aplausos fervorosos dos moradores, frequentadores do Cinema ao Ar Livre, erguido a cada novo ano, com fina engenharia. Fina e rigorosa, pois o telão deve resistir aos razantes de ventos que refrescam a aprazível Praia do Maceió.

Alguns dos 30 curtas do Nós do Audiovisual foram selecionados para os mais importantes festivais nacionais. Caso de “Maremoto”, de Cristina Lima e Juliana Bezerra, que vai disputar o Troféu Candango na quinquagésima-sétima edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (de 30 de novembro a 7 de dezembro).

O projeto “A Alma de Teodorico”, do Coletivo Nós do Audiovisual, recebeu prêmio especial da Mistika e DOT © Sara De Santis

A décima-segunda edição da Mostra de Gostoso começou, seis dias atrás, com “sala” abarrotada. Todos queriam ver o documentário “Kubrusly: Milagre Sempre Há de Pintar por Aí”, de Caio Cavechini e Evelyn Kuriki. As 700 espreguiçadeiras do Cinema ao Ar Livre não foram suficientes. Havia gente sentada em pequenas cadeiras de praia trazidas de casa, em esteiras e cangas, nas laterais do telão. E uma centena de jovens, muitos deles do Coletivo do Audiovisual gostosense, sentados na faixa de areia, próxima à tela. Em Gostoso, o espectador afunda os pés na morna areia, enquanto olha para a maior tela praieira do Brasil. A governadora potiguar Fátima Bezerra fez questão de evocar esse dado digno de um livro de recordes, modelo Guiness.

A sessão inaugural, na presença de Maurício Kubrusly, vítima de Mal de Alzheimer, acompanhado de sua esposa Beatriz Goulart e de numerosa equipe de realizadores e produtores (estes da Globoplay), serviu para mostrar que o serviço de streaming da família Marinho entrou firme na disputa pela vitrine nos festivais. A Netflix e a Amazon chegaram primeiro. Tudo começou em Gramado. E está se espalhando. Agora com outros players disputando tal visibilidade.

O Festival de Brasília, por exemplo, vai oferecer vitrine a vários teledocumentários, um deles da TV Brasil. Dois da Globoplay. São de sinergia (entre telinhas e telões) os tempos que correm.

A décima-primeira edição da Mostra de Cinema de Gostoso nos induz a uma constatação: o festival cresceu de forma exponencial. Nas sessões de sexta, sábado e domingo, o balneário ferveu. A disputa por uma das 700 espreguiçadeiras (mais que a lotação do Cine Brasília, de 606 lugares) foi, para uns, inglória. Raquel Hallak, da Mostra Tiradentes, CineOP e CineBH, contou que não conseguiu assento. Regressou ao hotel. O jeito foi esperar a calmaria voltar na segunda e terça-feira, quando o balneário, “onde o vento faz a curva”, recobrou certa “normalidade”. Ou seja, tornou possível conseguir um assento-espreguiçadeira.

A noite de encerramento foi das mais felizes. A qualidade acústica do Cinema ao Ar Livre (som 7.1), o tamanho da tela (12m x 6,5m) somado a luminosa projeção com resolução 4K potencializaram o alcance musical dos maiores sucessos de Luiz Melodia (“Pérola Negra”, “Estácio Holly Estácio” e “Juventude Transviada”).

O longa documental de Alessandra Dorgan deixou a plateia em estado de euforia e felicidade. Mesmo que o filme não esconda os perrengues que marcaram a trajetória do moleque nascido no Morro de São Carlos, em 1951. E que morreria 66 anos depois, em conflito com gravadoras, incapazes de domar seu espírito rebelde e “maldito”.

A noite contou, ainda, com a exibição de curta documental gostosense — “Fim de Jogo”, de Clara Leal —, fruto de parceria do Coletivo Nós do Audiovisual, CDHEC (Centro de Direitos Humanos, Ecologia e Cultura) e Heco Produções.

Com humor, característica marcante na maioria dos 30 curtas do Coletivo, somos informados de peculiaridade local. Alguns gostosenses cultivam a mania de fazer apostas durante o processo eleitoral. Além de fazer sua escolha (aquela que será depositada na urna), apostam bens significativos (casas, motos, terrenos, cordões de ouro) em seu candidato preferido. Alguns desses “malucos por apostas” quase mataram suas esposas, quando elas souberam que eles haviam apostado a própria casa, o lar-abrigo de suas famílias, no candidato xis ou ipsilon.

Confira os premiados:

. “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal (RJ) – melhor filme pelo Júri Popular, Prêmio Mistika e DOT no valor de R$30 mil em serviços

. “Manas”, de Marianna Brennand (PE) – melhor filme pelo Júri da Imprensa

. “Hoje Eu Só Volto Amanhã”, de Diego Lacerda (PE) – melhor curta-metragem pelo Júri Popular e pelo Júri da Imprensa

. “Bati da Vila”, de Raquel Cardozo (RN) – Prêmio Mistika e DOT (R$8 mil reais em serviços)

. “Raposa”, de Margot Leitão e João Fontenele (CE) – menção honrosa

. Projeto  “A Alma de Teodorico” — Prêmio Mistika e DOT, em serviços,  no valor de R$50 mil para o Coletivo Nós do Audiovisual realizar este que será seu primeiro longa-metragem

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